Share

Pilot Study

The occurrence of voicing variants in pretonic high vowels in Brazilian Portuguese (PB): a pilot study of the speech of inhabitants of the city of São Paulo

Giselda da Rocha Fagundes

Federal University of Para image/svg+xml

https://orcid.org/0000-0001-7976-3585


Keywords

Pretonic high vowels
Variants of voicing
Acoustics analysis

Abstract

This research had as objective to verify the existence of variants of voicing of the high pretonic vowels in Brazilian Portuguese. For this purpose, the audio recording of six (6) informants from São Paulo, three (3) women and three (3) men, from 20 to 35 years and with higher education. The corpus for the acoustic analysis was formed by the recording, in five randomized repetitions, of four-syllable words and pentassílabos in the phrase vehicle "Diga ____ logo", totaling of 1.440 phrases, containing the target words. Our results confirmed that, in the medial pretonic context, the speakers perform three variants of the high vowels, namely: vowels voiced, partially voiced and voiceless, voices having the highest occurrence, 55.62%. It was also possible to observe that there was difference in the realization of variants between: the anterior and posterior high vowel; female and male subjects; four-syllables and four-syllables; and between consonants of the target syllable, but, in the majority, prevailing the voiced variant.

Introdução

O desvozeamento, de forma geral, compreende a perda do traço sonoro ou vozeado de um som, a depender do contexto (CRYSTAL, 1988). As vogais desvozeadas podem ser definidas como vogais articuladas com a glote aberta, em configuração semelhante àquela encontrada na articulação de consoantes não vozeadas. O desvozeamento vocálico pressupõe que as vogais sejam articuladas com ausência de vibração glotal (GREENBERG, 1990, p. 80).

Segundo Gordon (1998), em línguas como o japonês, o francês de Montreal, o grego, o turco e o coreano, as vogais variam em um continuum entre vozeadas, desvozeadas ou com algum grau de desvozeamento, em função de fatores fonéticos, como a posição acentual, os limites prosódicos, a altura da vogal, a sonoridade das consoantes e a velocidade da fala, sendo possível afirmar que, na maioria das línguas, o desvozeamento é um fenômeno gradiente. Por outro lado, Gordon (1998) também relata que, em algumas línguas, o desvozeamento tem carácter fonológico: as vogais vozeadas contrastam com as vogais desvozeadas.

O fenômeno de desvozeamento vocálico é comum em algumas línguas do mundo (GORDON, 1998), em especial no japonês, dentre os quais destacamos os estudos de Han (1962); Kondo (1977); Tsuchida (2001) e Yoshioka (1981). Os estudos de Meneses (2012; 2016) também identificaram, no Português Brasileiro (doravante PB), variantes de vozeamento, contudo, somente nas vogais médias altas postônicas finais, já Cruz (2013), observou desvozeamento nas vogais médias pretônicas alteadas.

Desta forma, tendo como ponto de partida os achados de Cruz (2013) e Meneses (2012; 2016) esta pesquisa teve como objetivo investigar a existência de variantes de vozeamento das vogais altas pretônicas no PB. Para tanto, buscamos montar um protocolo de coleta com base nos estudos de Meneses (2012; 2016); aplicar o instrumento em informantes dos sexos feminino e masculino, mas, especificamente paulistas; identificar, com base na análise acústica espectral e na metodologia de Meneses (idem; idem), a ocorrência de variantes de vozeamento, a saber: vozeamento, vozeamento parcial e desvozeamento.

1. Motivações e Hipóteses

O fato de o desvozeamento de vogais ser um fenômeno amplamente estudado em outras línguas naturais, tendo-se o japonês como destaque, e as ocorrências atestadas por Cruz (2013) na fala de Belenenses, foram as motivações iniciais deste estudo. Outra motivação vem da escassez de estudos sobre o tema no PB.

Assim, partindo do seguinte questionamento: há variantes de vozeamento ocorrendo em vogais altas em contexto pretônico medial, assim como já atestado no contexto postônicas? Nossa hipótese é de que sim, há, nesse recorte, a ocorrência de três variantes de vozeamento como as encontradas por Meneses (2012; 2016), quais sejam: vozeamento, vozeamento parcial e desvozeamento.

Uma vez que a metodologia deste estudo foi desenvolvida no período de Doutorado Sanduíche da pesquisadora na UNICAMP, buscamos montar um protocolo de coleta que nos permitisse verificar, de forma imediata, se as condições que propiciaram a presença de desvozeamento de vogais altas postônicas, como em Meneses (2016), se aplicam as pretônicas, assim, escolhemos a variedade da capital paulistana para este estudo piloto.

Logo, identificar a ocorrência de variantes de vozeamento nas vogais altas em contexto pretônico na variedade paulistana foi outra grande motivação para que empreendêssemos este estudo de grande relevância para as pesquisas futuras sobre as pretônicas no Brasil.

2. Revisão da Literatura: o Desvozeamento no PB

Sobre o desvozemento no Português Brasileiro, temos em destaque os estudos empreendidos por Meneses (2012; 2016), Meneses e Albano (2013; 2014; 2015), Meneses et al (2016) e Souza (2012), além do trabalho de Cruz (2013).

Meneses (2012) investiga as vogais desvozeadas do Português Brasileiro, com o objetivo de avaliar se o quê ocorre com essas vogais trata-se de uma síncope vocálica ou se elas são encobertas pelas consoantes adjacentes. O autor realizou uma análise acústico-articulatória para mostrar que, mesmo quando não ficam visíveis as características de ressonâncias do trato vocal no espectrograma, há rastros da vogal que impossibilitam uma hipótese de síncope vocálica. O pesquisador procedeu a gravação da leitura de frases-veículo, de seis informantes do sexo feminino naturais de Vitória da Conquista/BA.

Como resultado, o autor observou o fenômeno nas vogais altas em ambiente consonantal surdo, assim como uma ocorrência pequena de desvozeamento das vogais baixas que variou muito entre os sujeitos. Não houve desvozeamento em vogais médias. Outro fator relatado foi a variação entre os informantes de vogais totalmente e parcialmente desvozeadas e vozeadas.

Souza (2012) analisou a redução das vogais altas [i] e [u] em sílabas CVC fechadas pela sibilante [s] no português falado em Belo Horizonte. Foram gravadas de frases-veículo produzidas por 16 informantes (oito homens, oito mulheres) nativos de Belo Horizonte constituindo duas faixas etárias distintas (21-25 e 35-62 anos). Metade dos resultados foi analisada com um equipamento eletroglotógrafo (EGG), utilizado somente para sanar dúvidas quanto à sobreposição dos gestos glóticos. Cabe ressaltar que o autor utilizou o termo redução vocálica para englobar tanto os casos de diminuição na duração vocálica como casos de cancelamento e de desvozeamento.

Os resultados mostraram que a velocidade de fala, o tipo de vogal e a tonicidade foram os fatores estruturais que influenciaram a ocorrência das reduções vocálicas, além do fator não estrutural idade, com a redução ocorrendo mais frequentemente entre os jovens. Com relação à frequência lexical, a frequência de ocorrência influenciou a redução de [u], e a frequência de tipo a redução de [i]. Os resultados mostraram ainda que houve maior redução da vogal anterior do que da vogal posterior.

Cruz (2013), ao realizar um estudo acústico sobre o sistema vocálico do português falado na Amazônia paraense, detectou o que afirmou ser a ocorrência de uma quarta variante no nível acústico: o desvozeamento de vogais médias pretônicas, dada a quantidade de dados de vogais desvozeadas e o fato de quase todos os vocábulos registrarem uma ocorrência ou outra do fenômeno.

A autora apresentou de forma qualitativa, no corpus analisado do português falado em Belém, um total de 89 ocorrências do fenômeno de desvozeamento, em 17 vocábulos dos 74 que compunham o corpus. A autora ressaltou que, embora o estudo trate de vogais médias, todas as vogais desvozeadas foram percebidas como vogais altas, com exceção da vogal pretônica anterior desvozeada no vocábulo “professora”, que foi percebida como média fechada.

A pesquisadora também observou que a vogal pretônica anterior apresentou maior ocorrência de desvozeamento, com 72 ocorrências, do que à vogal posterior, com 17 ocorrências. Com relação ao contexto precedente, a pesquisadora evidenciou que as vogais tendem a desvozear quando em sílaba com ataque vazio e que as consoantes palatais vão favorecer o desvozeamento das vogais anteriores. A autora ainda afirma que o fenômeno não se configura como um caso de harmonia vocálica, mas de redução vocálica, já que as vogais / a / e / e / são as maiores favorecedoras de desvozeamento quando ocupam a sílaba tônica.

Meneses e Albano (2014) investigaram a percepção de vogais desvozeadas e a sua relação com o alongamento das fricativas alveolares surdas no PB, por meio de um teste de identificação realizado com seis sujeitos do estado da Bahia. Os autores observaram que o vozeamento mínimo foi suficiente para o reconhecimento da vogal, enquanto o desvozeamento completo induziu aos erros.

Meneses (2016) investiga dois tipos diferentes de redução, o desvozeamento das vogais postônicas altas e a elisão da vogal baixa em sândi. O autor afirma que ambos os fenômenos “estão relacionados ao acento e a velocidade de fala que alteraram toda a configuração dos articuladores” (MENESES, 2016, p.07).

O autor apresenta uma nova visão dos resultados de Meneses (2012) e afirma que a velocidade de movimentação dos gestos supraglóticos acaba por inibir o vozeamento, não havendo tempo suficiente para retomar o vozeamento da vogal em ambiente desvozeado. Este fato, de acordo com o pesquisador, leva à equívocos de percepção.

O autor ainda afirma que a redução das vogais átonas finais no PB é gradiente e varia entre vozeamento e desvozeamento completo, passando pelo desvozeamento parcial, como resultado de diferentes graus de sobreposição gestual entre vogais e consoantes e chama atenção para o fato de que se “a sobreposição com desvozeamento total for aceita como variante, a apócope pode ser gradualmente assumida por mais e mais ouvintes, uma vez que estes têm graus variáveis de sensibilidade aos sinais da vogal.” (MENESES, 2016, p.87) e concluiu ser este um passo decisivo em direção ao apagamento da vogal.

Os estudos que investigam o desvozeamento no PB são relativamente recentes (SOUZA, 2012; MENESES, 2012; 2016) e todos apontam para a ocorrência do fenômeno somente nas vogais altas postônicas, com exceção de Cruz (2013), que observou ocorrência de desvozeamento nas vogais médias alteadas. Assim, inspirados e instigados por esses estudos, em especial na metodologia utilizada por Meneses (2012 e 2016), como mencionado, desenvolvemos a metodologia que descreveremos a seguir.

3. Metodologia

O corpus de coleta foi formado por um total de 48 (quarenta e oito) vocábulos sendo 24 (vinte e quatro) quadrissílabos e 24 (quatro) pentassílabos, todos paroxítonos, tendo os pentassílabos o mesmo radical dos quadrissílabos. As sílabas com as vogais analisadas são do tipo consoante-vogal (CV), cujas vogais alvo, /i/ e /u/, em contexto pretônico medial, estão entre as consoantes /p, t, tʃ, k, f, s, ʃ, /, no ataque da sílaba alvo e no ataque da sílaba subsequente, por exemplo: TROPICALISMO e BATUCADA.

Os vocábulos foram selecionados, majoritariamente, com base na frequência de uso oral no PB utilizando o corpus LAEL SILABADO do Programa de Estudos Pós-Graduados em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PEPG/LAEL/ PUCSP).

Todos os sujeitos, conforme legislação vigente, participaram voluntariamente das gravações e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido preparado pela autora e aprovado pelo Comitê de Ética do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pará (UFPA), e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Participaram desta pesquisa 6 seis sujeitos naturais e residentes do município de São Paulo, 03 (três) do sexo feminino e 03 (três) do sexo masculino, com Faixa Etária de 20 a 35 anos e Nível Superior de Escolaridade. Todos sem queixas de fala.

Foram gravadas cinco repetições aleatorizadas dos vocábulos na frase veículo “Diga ________ logo”, totalizando 240 (duzentos e quarenta) frases para cada informante. Desta forma, obtivemos um corpus de 1440 (um mil quatrocentos e quarenta) frases com vocábulos analisáveis. As gravações ocorreram no Laboratório de Fonética e Psicolinguística – LAFAPE, da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP/SP. Os equipamentos utilizados foram um gravador de voz ZOOM H2n Handy Record; um computador com processador Intel Dual Core 2.4 GHZ, 4 GB DDRII 667 MHZ, HD 250 GB e 1 HD externo SAMSUNG GB (BACKUP).

As gravações foram realizadas em uma sala acusticamente isolada. O gravador foi posicionado à frente do informante que foi orientado a visualizar a frase no monitor à sua frente, e dizê-la em voz alta enquanto a pesquisadora passava os slides. Cada informante realizou duas gravações. A primeira das 120 (cento e vinte) frases veículo aleatorizadas com os vocábulos alvo pentassílabos e a segunda gravação com as outras 120 (cento e vinte) frases aleatorizadas com os vocábulos-alvo quadrissílabos. Cada informante recebeu um código considerando o estado (SP), a ordem de gravação (1 a 6), o sexo (F ou M) e a gravação realizada (1 ou 2).

Para realizarmos a análise acústica empregamos o programa Praat (BOERSMA; WEENINK, 2001). Em nossa pesquisa, a utilização desse recurso garantiu a clareza na transcrição dos dados, haja vista que ele nos permitiu visualizar, por meio dos espectrogramas, a fala dos informantes. A partir dele foi possível fazer a transcrição, em Text Gride, dos sons das palavras alvo. A segmentação dos dados foi realizada por meio da observação da forma da onda e do espectrograma e ocorreu em quatro níveis: Frase, Vocábulo alvo, sílaba e sílaba alvo.

No nível 1 (um), transcrevemos todas as frases de cada informante; no nível 2 (dois), selecionamos para a transcrição apenas os vocábulos alvo; no nível 3 (três), realizamos a separação silábica das sílabas dos vocábulos-alvo identificando as pretônicas, a tônica e a postônica; no nível 4 (quatro), realizamos a identificação da sílaba alvo realizando a separação entre consoante e vogal em sílabas vozeadas e parcialmente vozeadas, e mantendo as juntas em caso de desvozeamento.

O Praat nos permitiu delimitar o início e término de cada enunciado, vocábulo, sílaba e som, bem como extrair do sinal original os vocábulos analisados. Assim, identificamos como vogais: vozeadas, aquelas cuja ocorrência é nitidamente perceptível no sinal acústico; parcialmente desvozeadas, aquelas que apresentam uma ocorrência minimamente perceptível no sinal acústico, apresentando “uma porção periódica curta com alguns pulsos glóticos (média = 4) e duração reduzida (média = 20 ms)”. (MENESES, 2016, p. 40-41); e desvozeadas, aquelas que não são perceptíveis no sinal acústico, ou seja, há uma ausência de periodicidade no sinal acústico.

Os parâmetros acústico-articulatórios analisados para classificar as variantes de vozeamento foram as medidas de duração das sílabas, duração das vogais altas, F0, formantes vocálicos F1 e F2, além das medidas de dois momentos espectrais, centroide e desvio padrão, das consoantes oclusivas, fricativas e africadas.

Após a segmentação do sinal acústico o tratamento dos dados acústicos compreendeu as seguintes etapas: 1) Extração dos arquivos de áudio e textgrid de cada frase das gravações originais com o programa Praat; 2) Codificação dos dados. A codificação dada às gravações extraídas dos informantes teve como base a codificação do informante, acrescida do vocábulo alvo estudado e sua repetição que varia de 1 a 5.

Desta forma, temos o arquivo PA04F2_ARQUITETO_3, por exemplo. 3) Identificação, em pastas separadas, das variantes vozeada, parcialmente vozeada e desvozeada ocorridas por vocábulo, considerando os dados de cada informante; 4) Organização dos dados obtidos em uma primeira planilha Excel onde especificamos o informante, estado, sexo, som, número de sílabas, vogal, consoante, ataque 1 e ataque 2; 5) Sistematização dos dados em uma segunda planilha Excel para análise estatística dos dados com o software aplicativo SPSS; 6) Análise Estatística dos dados com o SPSS.

4. Análise e discussão dos resultados

Foram analisados um total de 1440 frases. A tabela 1 e o gráfico 1, a seguir, apresentam os resultados gerais dos dados analisados, apresentando a ocorrência das variantes de desvozeamento, vozeamento parcial e vozeamento.

Variante Ocorrência Percentual
Desvozeamento 562/1440 801/1440
Vozeamento Parcial 562/1440 5,35%
Vozeamento 801/1440 55,62%
Table 1. Tabela 1. Ocorrência das variantes de vozeamento. Fonte: Elaborada pela autora.

Figure 1. Gráfico 1. Ocorrências das variantes de vozeamento. Fonte: Elaborado pela autora usando o SPSS.

Conforme observado na tabela 1 e no gráfico 1, a variante de vozeamento foi a variante de maior ocorrência entre os informantes, como 55,62% de ocorrência, seguida pela variante de desvozeamento, com 39,03% e, por último, com a menor ocorrência, temos a variante parcialmente vozeada, com 5,35%. O gráfico 2 mostra os percentuais das ocorrências das variantes por informante.

Figure 2. Gráfico 2. Ocorrência das variantes de vozeamento por informante. Fonte: Elaborado pela autora usando o SPSS.

No gráfico 2 podemos observar que a ocorrência das variantes de vozeamento varia também de informante para informante, sendo os informantes masculinos os que apresentam os maiores índices de vozeamento e vozeamento parcial. Podemos observar melhor esses percentuais no gráfico 3, a seguir.

Figure 3. Gráfico 3. Ocorrência das variantes de vozeamento por sexo. Fonte: Elaborado pela autora usando o SPSS.

No gráfico 3 fica evidente que o vozeamento é a variante de maior ocorrência em ambos os sexos, contudo, o sexo feminino apresentou maior índice de ocorrência de desvozeamento, 42,08%,eo sexo masculino, 35,97%. O sexo masculino também apresentou maior índice de ocorrência na soma das variantes vozeadas, 64,03%, enquanto o feminino apresentou 57,92% de vozeamento ou vozeamento parcial. Já no gráfico 4 apresentamos a ocorrência das variantes de vozeamento por vogal alvo.

Figure 4. Gráfico 4. Ocorrência das variantes de vozeamento por vogal alvo. Fonte: Elaborado pela autora usando o SPSS.

Observamos, no gráfico 4, que, entre vogais, a vogal /i/ foi a vogal que apresentou maior índice de desvozeamento, 48,89%, e a vogal /u/ maior índice de vozeamento, 64,86%. Já intra-vogal, o índice de desvozeamento da vogal anterior foi levemente superior a variante de vozeamento exatos 2,50%, porém levemente inferior, 2,22%, se somarmos as variantes vozeadas. Com relação a vogal posterior, as variantes vozeadas somadas representam cerca de 70% das ocorrências. No gráfico 5, abaixo, apresentamos a ocorrência das variantes de vozeamento com o cruzamento das vogais alvo e o sexo dos informantes.

Figure 5. Gráfico 5. Ocorrência das variantes de vozeamento com o cruzamento “vogal alvo” x “sexo do informante”. Fonte: Elaborado pela autora usando o SPSS.

Este gráfico 5 reforça o que apresentamos nos gráficos 3 e 4, que a realização da variante desvozeada ocorre com maior frequência no sexo feminino do que no masculino, e na vogal /i/ mais do que na vogal /u/, contudo a variante de vozeamento é a que apresentou maior realização em quase todos os contextos apresentados no cruzamento, exceto para /i/ feminino, cujo índice de desvozeamento foi levemente superior. No gráfico 6 apresentamos as ocorrências de vozeamento por número de sílabas.

Figure 6. Gráfico 6. Ocorrência das variantes de vozeamento por número de sílabas. Fonte: Elaborado pela autora usando o SPSS.

No gráfico 6 novamente observamos a superioridade da realização das vogais vozeadas sobre as demais variantes em ambos os tipos de vocábulos, contudo, os vocábulos pentassílabos apresentaram maior índice de desvozeamento, bem como um índice menor de vozeamento que os vocábulos quadrissílabos.

Analisamos também, a relação entre as ocorrências de vozeamento e os tipos de consoante da sílaba alvo. Esse resultado está expresso no gráfico 7, a seguir.

Figure 7. Gráfico 7. Ocorrência das variantes de vozeamento por tipo de consoante. Fonte: Elaborado pela autora usando o SPSS.

No Gráfico 7 verificamos que somente a vogal diante da consoante africada apresentou índice maior de desvozeamento do que de vozeamento, lembrando que só houve realização da oclusiva /t/ diante de /u/ e da africada /tʃ/ diante de /i/. Como podemos observar no gráfico 8.

Figure 8. Gráfico 8. Cruzamento “vogal alvo” x “tipo de consoante” por variante de vozeamento. Fonte: Elaborado pela autora usando o SPSS.

Novamente podemos observar que a vogal /i/ apresentou maiores ocorrências de desvozeamento do que a vogal /u/. No Gráfico 9, apresentamos os índices das variantes de vozeamento e sua ocorrência diante de cada consoante controlada na sílaba alvo.

Figure 9. Gráfico 9. Ocorrência das variantes de vozeamento diante da consoante da sílaba alvo. Fonte: Elaborado pela autora usando o SPSS.

Verificamos no gráfico 9 que, com exceção da vogal diante de /tʃ/, como já mencionamos, somente a consoante oclusiva /k/ apresentou índice levemente maior do desvozeamento em detrimento do vozeamento, mas essa diferença de índice não chega a 0,30%, ou seja, não há uma diferença significativa. No gráfico 10 apresentamos a ocorrência das variantes de vozeamento das vogais alvo diante de cada consoante da sílaba alvo.

Figure 10. Gráfico 10. Ocorrência das variantes de vozeamento pelo cruzamento “vogal alvo” x “consoante da sílaba alvo”. Fonte: Elaborado pela autora usando o SPSS.

Notamos, uma vez mais que, independentemente da consoante, a vogal /u/ apresentou maiores índice de vozeamento, em detrimento do desvozeamento e do vozeamento parcial, já a vogal apresentou maiores índices de desvozeamento diante de /k/, /s/ e /tʃ/.

5. Conclusão

Esta pesquisa teve como objetivo apresentar a ocorrência de variantes de vozeamento nas vogais altas pretônicas no Português Brasileiro falado na cidade de São Paulo. Para tanto, realizamos a análise acústica, no Software PRAAT, das gravações de áudio de 06 (seis) informantes, sendo 03 (três) do sexo feminino e 03 (três) do sexo masculino, de 20 a 35 anos, e de ensino superior.

Nossos resultados mostraram que o vozeamento foi a variável de maior ocorrência, seguido do desvozeamento e de um número bem pequeno de vozeamento parcial. A vogal /u/ foi a vogal que apresentou maior índice de vozeamento, 64,86%, e a vogal /i / maior índice de desvozeamento, 48,89%, contudo esse índice foi aproximado do índice de vozeamento, 46,39%.

Com relação ao sexo, o vozeamento foi a variante de maior ocorrência, tanto no sexo feminino quanto no sexo masculino, tendo no sexo masculino sua maior realização, embora os índices de ocorrência de vozeamento entre homens e mulheres tenham sido muito próximos.

Todavia, a relação entre Sexo X Vogal Alvo mostrou que, na fala das mulheres, a vogal /i/ apresentou maior ocorrência da variante desvozeada, ao passo que na fala dos homens a variante vozeada predomina em ambas as vogais estudadas.

Com relação ao número de sílabas, o vozeamento foi a variante de maior ocorrência tanto em quadrissílabos quanto em pentassílabos, sendo que, o índice de desvozeamento foi maior em pentassílabos, 41,25%, do que em quadrissílabos, 36,81%.

Os resultados mostraram, ainda que, com exceção da consoante africada que só foi realizada diante da vogal alta anterior, o índice da variante vozeada foi maior tanto nas vogais diante das consoantes fricativas, quanto nas oclusivas com exceção de /k/, que na média geral, apresentou índice percentual da variante desvozeada levemente superior, embora essa diferença seja menor que 0,30%.

Ressaltamos que, por se tratar de um estudo piloto, nossos resultados indicam tendências acústicas, sendo necessárias outras análises acústicas, articulatórias e/ou perceptuais para que possamos consolidar os resultados deste primeiro estudo, bem como compará-lo com as análises e resultados de dados coletados da variedade falada em Belém/PA, cuja ocorrência de desvozeamento em vogais pretônicas, como mencionado, foi identificada por Cruz (2013). Assim, poderemos ter um melhor entendimento sobre a ocorrência de variantes de vozeamento nas vogais altas pretônicas mediais no Português Brasileiro (PB).

6. Agradecimentos

Este estudo foi desenvolvido durante a realização do doutorado em Letras/Estudos Linguísticos na Universidade Federal do Pará (UFPA). Agradeço ao CNPq pela bolsa SWP concedida.

Referências

BOERSMA, P.; WEENINK, D. PRAAT: a system for doing phonetics by computer. Glot international. volume 5. 341-345, 2001.

CRUZ, R. Desvozeamento das vogais médias pretônicas no português da Amazônia paraense: a quarta variante. Organon, Porto Alegre, v. 28, n. 54, p. 115-136, jan./jun, 2013.

CRYSTAL, D. Dicionário de linguística e fonética. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988.

FUJIMOTO, M. Vowel duration and vowel devoicing in japanese: a comparison between Tokyo and Osaka dialect speakers. Kokugogaku: studies in the Japanese languages, Tóquio, v. 55, n. 1, p. 2-15, 2004.

GORDON, M. The phonetics and phonology of non-modal vowels: a cross-linguistic perspective. Berkeley Linguistics Society, v. 24, p. 93-105, 1998.

GREENBERG, J. H et al. On Language: Selected writings of Joseph H. Greenberg. Stanford: Stanford University Press, 1990.

HAN, M. Unvoicing of vowels in Japanese. Onsei no Kenkyu. (Study of Sounds), Nihon Onsei Gakkai (The Phonetic Society of Japan), Tóquio, n.10, p. 81-100, 1962.

KONDO, M. Mechanisms of vowel devoicing in japanese. Ph.D. (Dissertation in Linguistics) – University of Edinburg, Edinburg, 1977.

MENESES, F. O. Investigação acústico-articulatória das vogais desvozeadas no português brasileiro. 2012. 111f. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012.

______________. Uma visão dinâmica dos processos de apagamento de vogais no português brasileiro. 2016. 140f. Tese (Doutorado em Linguística) – Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2016.

MENESES, F.; ALBANO, E. From devoicing to apocope: an acoustic study of poststressed high vowel lenition in Brazilian Portuguese. Phonetics and Phonology in Iberia, Universidade de Lisboa, 2013.

______________. Lenição da vogal alta final no PB: evidências de um experimento perceptual. In: OLIVEIRA, M. S.; PACHECO, V. (orgs.). SEMINÁRIO DE PESQUISA EM ESTUDOS LINGUÍSTICOS, 8., 2014, Vitória da Conquista. Anais [...]. V. 8, n. 1. Vitória da Conquista, BA: GPEL, 2014. p. 231-238.

______________. From reduction apocope: final poststreessed vowel devoicing in Brazilian Portuguesa. Phonetica, v. 72, n. 2-3, p. 121-137, 2015.

MENESES, F et al. Gesture and velocity in voiced and devoiced vowels: EMA evidence from Brazilian Portuguese. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DE CIÊNCIA DA FALA, 5., 2016, Belo Horizonte. Anais [...]. Belo Horinzonte, MG, 28 a 30 set. 2016.

SOUZA, R. F. N. Redução de vogais altas pretônicas no português de Belo Horizonte: uma abordagem baseada na gradiência. 2012. 146f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Pós-graduação em Estudos Linguísticos, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2012.

TSUCHIDA, A. Phonetics and Phonology of Japanese Vowel Devoicing. 1997. Dissertation (PhD. Linguistics) – Cornell University, Ithaca, NY, 1997.

YOSHIOKA, H. Laryngeal adjustments in the production of the fricative consonants and devoiced vowels in Japanese. Phonetica, Basel, SWI, n. 38, p. 236-251, 1981.

How to Cite

FAGUNDES, G. da R. The occurrence of voicing variants in pretonic high vowels in Brazilian Portuguese (PB): a pilot study of the speech of inhabitants of the city of São Paulo. Cadernos de Linguística, [S. l.], v. 2, n. 4, p. e510, 2021. DOI: 10.25189/2675-4916.2021.v2.n4.id510. Disponível em: https://cadernos.abralin.org/index.php/cadernos/article/view/510. Acesso em: 26 apr. 2024.

Statistics

Copyright

© All Rights Reserved to the Authors

Cadernos de Linguística supports the Opens Science movement

Collaborate with the journal.

Submit your paper