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Theoretical Essay

Ernesto Faria (1906-1952) and Latin for the Education of Philologists and Linguists in 20th Century Brazil: Historiographical Analysis

Leonardo Ferreira Kaltner

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https://orcid.org/0000-0003-3690-3132

Melyssa Cardozo Silva dos Santos

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https://orcid.org/0000-0003-0279-1611


Keywords

Latin grammaticography
Ernesto Faria
Latin

Abstract

The Latin Grammaticography in Brazil is one of the subjects of interest in the discipline of Historiography of Linguistics (HL) within our national context. In our text, we discuss theoretical and methodological aspects regarding the construction of a historiographical narrative on the history of Latin grammar in Brazil, following the "koernian" model developed by Konrad Koerner (2014) and Pierre Swiggers (2013; 2019). As an exemplary model for a (meta)historiographical narrative of the history of Latin grammar in Brazil, we also have the recent publication by Ricardo Cavaliere (UFF/ABL) on the history of grammar in Brazil (CAVALIERE, 2022), which can serve as a model for applying the "koernian" historiography for an analysis of our specific context. The topic of the history of Latin grammar in Brazil was approached in a pioneering way by the Latinist and philologist Ernesto Faria (1906-1962) in two of his main works: Gramática Superior da Língua Latina (FARIA, 1958) and Introdução à Didática do Latim (FARIA, 1959).

Resumo para não especialistas

A língua latina, ou o latim, é uma língua muito antiga e não é mais falada por nenhum povo hoje em dia, mesmo assim ainda é estudada. Ela foi falada pelo povo romano, na época da Roma antiga, e quando era falada era aprendida naturalmente por qualquer pessoa que vivesse sob os domínios de Roma, transmitida como as línguas naturais, aquelas que falamos atualmente. Depois da queda de Roma, mesmo quando a população da região do antigo Império Romano deixou de falar o latim, a língua continuou a ser estudada e ensinada, em uma tradição medieval, culturalmente religiosa e cristã, pois era instrumento da Teologia. Esse ensino passou da Idade Média até o Renascimento, e chegou à Idade Contemporânea em que vivemos, mas o latim deixou de ser uma língua exclusiva da Teologia, tornou-se uma língua instrumental da Filosofia racionalista e do Direito modernos, e posteriormente da Filologia Românica e da Linguística Histórica, ciências da linguagem. Um dos principais gramáticos do latim já na tradição universitária do Brasil do século XX foi o professor Ernesto Faria (1906-1962) que escreveu sobre o latim como disciplina instrumental da Filologia, para os cursos de Letras, o pensamento desse gramático é tema do artigo.

Introdução: recuperar o latim como disciplina instrumental da Linguística

O presente artigo, derivado de comunicação no XIII Congresso Internacional da Abralin, que ocorreu em 2023, na Universidade Federal do Paraná, é uma introdução às discussões que serão desenvolvidas no projeto de pesquisa Latim para linguistas: história, política e ensino, a ser realizado na Universidade Federal Fluminense, a partir do ano de 2024. O projeto situa-se no âmbito do grupo de pesquisas Filologia, línguas clássicas e línguas formadoras da cultura nacional (FILIC/CNPq/UFF) e vincula-se às atividades de pesquisa e de docência no Programa de Pós-graduação em Estudos da Linguagem da UFF, no contexto da linha de pesquisa: História, política e contato linguístico. As reflexões do projeto de pesquisa relacionam-se, interdisciplinarmente, às disciplinas de Historiografia da Linguística (KOERNER, 2014; SWIGGERS, 2019), de História das Ideias Linguísticas (AUROUX, 1992; COLOMBAT; FOURNIER; PUECH, 2017) e de Políticas Linguísticas (CALVET, 2007), componentes curriculares e áreas temáticas do referido programa de Pós-graduação.

As reflexões que originaram o projeto derivam também de atividades de docência nas disciplinas de Língua Latina, Literatura Latina, Matrizes Clássicas e Latim Básico, no curso de Graduação em Letras do Instituto de Letras da UFF. Durante o exercício das atividades de docência, notamos uma carência relativa a textos didáticos de latim escritos em português brasileiro que tratassem da descrição e da história da língua latina de acordo com os desenvolvimentos mais recentes das teorias dos Estudos de Linguagem do século XXI, tema que nos interessa abordar, com a finalidade de desenvolver em momento posterior um material didático adequado ao público dos cursos de Graduação em Letras e Linguística atuais. Ainda que no mercado editorial haja boas opções recentes de métodos para o ensino de língua latina, alguns originais, outros traduzidos, parece haver uma lacuna entre essas publicações e os estudos descritivos do português brasileiro no contexto da Linguística desenvolvida no Brasil.

Em que pese, no contexto do Brasil uma escassez de estudos linguísticos atualizados a perspectivas teóricas contemporâneas do latim, já existem, nas últimas décadas, algumas iniciativas nesse sentido[1]. Recentemente, a Revista Veredas, volume 23, n. 1 (2019), da Universidade Federal de Juiz de Fora, apresentou dossiê temático inteiramente dedicado à Linguística Latina (SOUSA, FORTES, 2019), assim como latinistas têm apresentado esforços pontuais de propor uma aproximação entre a Linguística contemporânea e a área de Língua Latina (GONÇALVES, ARMELIN, 2018), na análise de fatos linguísticos específicos. Todavia, a divulgação desses esforços tem sido restrita a círculos de latinistas, não tendo ainda uma repercussão para o ensino de latim no contexto mais amplo das áreas de Letras e Linguística do Brasil.

A didática da língua latina, sem um material teórico adequado e atualizado, tende a distanciar-se do estudo de outras línguas na tradição acadêmica do Brasil, tornando o processo de ensino-aprendizado de língua latina mais dificultado para os estudantes e interessados de modo geral, pois a visão teórico-metodológica nos estudos do português brasileiro muitas vezes entra em contradição com uma visão teórica mais obsoleta, ou imprecisa, para a descrição dos fatos linguísticos da língua latina. Além disso, percebe-se que uma defasagem teórico-metodológica no material didático disponível para o ensino de latim faz com que o conhecimento da língua se torne menos sistematizado e científico, trazendo dificuldades que afastam possíveis interessados em seu estudo, sobretudo em campos como fonética e fonologia, morfologia, sintaxe, semântica, pragmática e análise discursiva de textos em latim. Logo, concepções linguísticas obsoletas, metalinguagem imprecisa para os padrões atuais e a falta de uma perspectiva científica na descrição linguística são alguns dos empecilhos para o aprendizado da língua latina no contexto do Brasil do século XXI.

O ensino de língua latina no Brasil pode dialogar com os Estudos da Linguagem mais recentes sobre o português brasileiro, a fim de alinhar-se ao pensamento linguístico vigente e permitir que a língua latina seja também uma disciplina instrumental na formação de linguistas em nosso contexto acadêmico. Pelo fato de que a língua latina é uma língua histórica, que não está mais em uso como língua natural, seu ensino pode ser um instrumento para o desenvolvimento de competências linguísticas de modo geral, isto é, o ensino de latim pode ser uma importante ferramenta para o estudo da Linguística e mesmo de outras línguas. Esse é um fator que deve ser posto em relevo, na formação de linguistas no Brasil, quanto a uma possível renovação dos estudos de língua latina e mesmo para a formação acadêmica de linguistas.

Para estabelecer essas reflexões, na perspectiva historiográfica, selecionamos como ponto de ancoragem (SWIGGERS, 2019) e objeto de estudos a obra do filólogo Ernesto Faria (1906-1962), um pensador dos estudos de língua latina que foi bastante influente no contexto do Rio de Janeiro em meados do século XX, com publicações acadêmicas na área de estudos da língua. A obra de Faria servirá para as reflexões historiográficas e de modelo para o desenvolvimento de reflexões renovadas sobre o ensino de latim no contexto do Brasil do século XXI, sobretudo para o trato de questões quanto ao perfil de formação na área. Nesse artigo daremos especial atenção ao prefácio de sua Gramática Superior da Língua Latina (FARIA, 1958), a fim de demonstrar como seu pensamento linguístico se desenvolveu. É um estudo ainda preliminar que busca formar as bases para uma nova gramática da língua latina.

1. Faria e a história da gramática de língua latina no Brasil

Entre os temas abordados por Ernesto Faria no conjunto de suas obras situam-se considerações sobre a história da gramática latina no Brasil e o seu ensino. Faria dissertou sobre quais foram as principais gramáticas superiores para o ensino de latim no Brasil, do século XVI ao XIX, situando a sua obra gramatical como uma inovação nessa tradição gramatical, no contexto do século XX (FARIA, 1958; 1959). Essas reflexões, que foram precursoras de uma gramaticografia latina no Brasil, desenvolvidas sobretudo na Introdução à didática do latim (FARIA, 1959), apontam que houve uma tradição contínua no Brasil para o ensino de língua latina desde o período da América portuguesa, no século XVI, o que se renovou em sucessivas épocas com a mudança do pensamento linguístico até a formação das universidades brasileiras já no século XX.

Esse fenômeno histórico de longa duração pode ser abordado no contexto das teorias historiográficas da Nova História, ou Escola dos Annales, de corrente francesa, o que é um dos métodos da Historiografia da Linguística, conforme descreve Ronaldo Batista (2019), ao comentar sobre as origens da disciplina, desenvolvida por Konrad Koerner, Pierre Swiggers e Sylvain Auroux, na primeira geração de historiógrafos e historiadores da linguística no contexto europeu. Batista comenta sobre o tópos da interdisciplinaridade como fator que vincula a Historiografia Linguística à Nova História, corrente europeia dos anos 1970:

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Trabalhos em Historiografia da Linguística algumas vezes apontam como uma de suas origens, remota por certo, a Nova História francesa. Tal influência ainda precisa ser analisada com mais cuidado e poder interpretativo, no entanto podem ser apontados alguns elementos desse diálogo, como a ampliação da interdisciplinaridade na análise histórica (BATISTA, 2019, p. 15).

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Essa questão histórica e historiográfica, que exige uma análise da “retrospecção” (COLOMBAT; FOURNIER; PUECH, 2017) de um modo holístico para a compreensão do pensamento e das ideias linguísticas relacionadas ao ensino de latim no Brasil, enquadra-se no que os autores acima citados debateram acerca da constituição do objeto de uma história das ideias linguísticas:

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Quando se trabalha com fatos ocorridos na longa duração do tempo, e, consequentemente se propõe levar em conta os saberes construídos em estados de sociedades diferentes, pertencentes a áreas culturais eventualmente diferentes, é preciso constituir uma concepção de objeto (os saberes construídos sobre as linguagens e as línguas) tão pouco normativa sobre o plano epistemológico quanto possível (COLOMBAT; FOURNIER; PUECH, 2017, p. 16).

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O objeto de estudos em questão pode ser definido como uma “latinização” do pensamento linguístico no Brasil[1], o que ocorreu pelo ensino de gramática latina durante vários séculos até o surgimento da Linguística como ciência, no século XIX, e a constituição do português brasileiro, sob influência da gramática latina. Pode-se perceber que o latim foi perdendo a sua centralidade no ensino de línguas do Brasil ao longo dos séculos, conforme a descrição do ensino de latim apresentada por Ernesto Faria (1958), tendo se tornado uma disciplina instrumental para o ensino de língua portuguesa, desde o século XVIII, quando o seu ensino passou a ser em língua vernácula. Atualmente, a língua latina pode ser um útil instrumento para os Estudos de Linguagem, na perspectiva analítica que propomos.

Em um estudo anterior (KALTNER, 2023), descrevemos como Faria interpretou as mudanças de paradigma linguístico na gramaticografia latina do Brasil, um tema que aprofundaremos nessa seção do artigo. Para Faria, houve três gramáticas representativas das mudanças do pensamento linguístico no Brasil quanto ao ensino de língua latina, tendo sido o que Swiggers (2013; 2019) conceituou como paradigmas do pensamento linguístico: a gramática de Manuel Álvares (1526-1583), nos séculos XVI a XVIII, a gramática de Antônio Pereira (1725-1797), nos séculos XVIII e XIX e a gramática de Madvig (1804-1886), no final do século XIX (KALTNER, SANTOS; 2023). Todas essas três obras eram relacionadas ao contexto intelectual de Portugal, o que caracteriza também o processo histórico do ensino de língua latina no Brasil como uma atividade linguística relacionada à recepção do pensamento linguístico europeu, em uma perspectiva luso-brasileira.

À época de Manuel Álvares, a língua latina era ensinada como uma disciplina instrumental da teologia, sobretudo na formação de missionários da colônia ultramarina do reino de Portugal. A gramática de Álvares era escrita em latim, tendo sido empregada conforme o sistema jesuítico da Ratio Studiorum, que dividia o ensino de gramática latina em classes, com cerca de três a cinco anos de duração. O modelo gramatical era o humanístico, em que a gramática latina era predominantemente prescritiva e relacionada à tradição dos autores latinos.

Já a gramática de Antônio Pereira, no modelo racionalista, tinha como objetivo o ensino da língua latina como disciplina instrumental da Filosofia racionalista, cuja Metafísica era ainda vinculada à Teologia no mundo lusófono, mas em uma perspectiva já secular se comparada com o humanismo renascentista, sendo a base do Direito moderno. O ensino de latim servia ao domínio de conceitos teóricos da metafísica e ao estudo filosófico do racionalismo, logo o latim era uma disciplina instrumental da Filosofia e do Direito, que eram praticados em língua portuguesa. O conceito de gramática racionalista estava vinculado ao modelo de Port Royal, na oposição entre gramática universal e gramática particular, o que resultou em uma gramática latina escrita já em português, como demonstra a obra de Antônio Pereira (TUFFANI, 2021; FARIA, 1959).

Por fim, a gramática de Madvig apresentava já uma visão cientificista, pautada no método histórico-comparativo da Filologia do século XIX. A língua como um produto de desenvolvimento histórico não era mais considerada como um objeto de estudos absoluto, mas relativa a um determinado contexto histórico social, ou a um povo e território. Assim, a língua latina passa a ser descrita em sua historicidade, de acordo com a história do povo romano e da civilização romana. O ensino de latim torna-se um instrumento da Filologia, sobretudo da Filologia Românica, tendo continuidade o seu ensino nesse contexto de Madvig. Essa perspectiva teria sido aprofundada por Ernesto Faria que considerava a sua gramática como sucessora da obra de Madvig (FARIA, 1958).

Atualmente, o ensino de língua latina pode se justificar como uma disciplina instrumental da Linguística, caso se adeque teoricamente o seu estudo ao desenvolvimento dos Estudos da Linguagem em curso no Brasil, por exemplo.

2. O prefácio da gramática superior de Ernesto Faria

Na Gramática Superior da Língua Latina (FARIA, 1958), magnum opus de Ernesto Faria, temos a sua descrição da língua latina dividida em três grandes campos linguísticos: Fonética, Morfologia e Sintaxe. A fim de iniciar o processo de análise de seu pensamento linguístico, o que se dará em uma série de estudos, iniciamos nossas reflexões sobre o prefácio da gramática, que é elucidador acerca da intenção da obra que buscava suceder à obra de Madvig. O universo de “usuários” (SWIGGERS, 2013; 2019) de sua gramática latina era então composto por setores educacionais diversos do contexto da obra, o Rio de Janeiro de meados do século XX: “professores do ensino médio, alunos dos cursos de letras das Faculdades de Filosofia, candidatos aos vestibulares das mesmas Faculdades e das Faculdades de Direito, e até mesmo aos alunos das últimas séries do curso secundário” (FARIA, 1958, p. 3).

Faria empregou a fonética histórica, e a partir dela fez uma defesa irrestrita da pronúncia reconstituída, como método para aproximar o ensino de latim no Brasil à Filologia Clássica europeia, sobretudo à de expressão francesa, que teve em Antoine Meillet (1866-1936) um de seus expoentes. Todavia, Rosalvo do Valle (2006), em um acurado estudo biográfico e historiográfico sobre Ernesto Faria, nos revela que a influência para a adoção da pronúncia reconstituída por Faria era derivada da influência de Antenor Nascentes e da obra de Vicente de Souza. Ao mesmo tempo, a obra gramatical de Faria vinha como concorrente às gramáticas de Ravizza e de Augusto Magne, que eram relacionados ao ensino de latim em seminários (TUFFANI, 2021).

Note-se que o latim à época ainda era profundamente estudado na formação do clero católico, sobretudo para o seu emprego litúrgico, em um contexto pré-conciliar, anterior ao Concílio Vaticano II, de 1968. Faria era conhecedor desses círculos intelectuais, tendo tido formação em seminário, todavia, não faz referência em seu grupo de usuários da gramática latina nenhuma finalidade teológica para o estudo do latim. Sua gramática era voltada para o contexto científico e secularizado já há muito tempo, em que se formaram as universidades brasileiras. As obras gramaticais latinas em meados do século XX que eram voltadas aos estudos teológicos eram principalmente as obras de Ravizza e Augusto Magne, que não são sequer citadas por Faria, o que demonstra interesses diversos com métodos diversos. Outro autor não mencionado por Faria era o professor Vandick Londres da Nóbrega, que escrevia materiais didáticos para uso exclusivo no contexto escolar, sobretudo o que se vinculava ao Colégio Pedro II (TUFFANI, 2021).

Esse contexto refletia os ideais da Reforma Campos de 1931, e mesmo o Estado Novo de Vargas, assim como a Reforma Capanema, de 1942 (FARIA, 1959), em que as línguas clássicas, ou antigas eram consideradas a base para os estudos humanísticos modernos. Nesse espírito humanístico podemos compreender as primeiras palavras de Faria no prefácio de sua gramática:

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O trabalho que ora apresentamos ao público destina-se, de um modo geral, a todos os que se dedicam ao estudo da língua latina: professores do ensino médio, alunos dos cursos de letras das Faculdades de Filosofia, candidatos aos vestibulares das mesmas Faculdades e das Faculdades de Direito, e até mesmo aos alunos das últimas séries do curso secundário, se bem orientados por seus competentes mestres (FARIA, 1958, p. 3).

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A presença do latim no ensino médio, a inserção do curso de letras com o ensino de latim nas Faculdades de Filosofia e o ensino de latim nas Faculdade de Direito eram herança da Reforma Campos na constituição do sistema de universidades federais da Era Vargas. Faria propunha uma obra que dialogasse com todos esses segmentos da sociedade, em um momento singular em sua carreira, quando já era professor catedrático de latim da Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro. A obra publicada em 1958 apoiava-se nos ideais da Reforma Capanema de 1942, com forte alinhamento à educação humanística europeia, em um “clima de opinião” já não mais tão favorável ao ensino de latim no Brasil, no contexto do desenvolvimentismo de Kubitschek. Ao mesmo tempo, a obra publicada em 1958 dois anos antes da mudança do Distrito Federal do Rio de Janeiro para Brasília (FAUSTO, 2006).

Faria advoga em sua “retórica” (BATISTA, 2019) pela objetividade no método descritivo da língua latina, em um apelo para uma cientificidade em seu ensino: “Ora, uma obra escrita para um tão extenso campo de leitores exige necessariamente uma exposição prévia em que se indiquem com clareza, objetividade e franqueza, os fins colimados e, principalmente, o método adotado em sua elaboração” (FARIA, 1958, p. 3). A educação humanística proposta por Capanema já não tinha a mesma receptividade na Era Kubitschek, o que ameaçava a continuidade do ensino de latim no contexto apresentado por Faria. Nesse sentido, a sistematização do ensino por uma gramática superior da língua latina era uma reação, na defesa desse ensino humanístico, que entrava em choque com os ideais desenvolvimentistas de uma educação linguística voltada à industrialização, esse “embate teórico” (SWIGGERS, 2013; 2019) foi rotulado por Faria como a recorrente querela entre antigos e modernos (FARIA, 1959).

Com efeito, o latinista argumentou sobre a finalidade de sua gramática que era vincular os estudos da normatização gramatical do latim com o rigor científico do método histórico-comparativo, tema da Filologia Clássica de sua época. Nesse sentido, o “critério puramente normativo” na descrição da língua latina era considerado por Faria como uma visão defasada cientificamente, caso não tivesse apoio no “método histórico”. Ao mesmo tempo, a gramática superior foi pensada para o leitor de língua portuguesa, alinhando-se aos estudos de língua portuguesa de seu clima de opinião, cuja principal influência vinha dos filólogos relacionados ao círculo intelectual de Serafim da Silva Neto (VALLE, 2006).

Vejamos no prefácio como a orientação linguística da obra já a vinculava à descrição dos fatos da língua latina, descritos pelo rigor científico do método histórico:

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A primeira finalidade visada foi oferecer ao leitor de língua portuguesa uma explanação tão completa quanto possível dos fatos da língua latina, não só segundo o critério puramente normativo, mas também, na medida do possível, procurando atender, com rigor científico, às exigências do método histórico (FARIA, 1958, p. 3).

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O método histórico-comparativo vinculava a descrição dos fatos da língua latina a uma análise filológica que relacionava o latim, de um lado, ao indo-europeu e, do outro, às línguas neolatinas modernas. O latim situava-se assim como um estado de língua central para os estudos filológicos do indo-europeu às línguas românicas, ao mesmo tempo era também uma língua instrumental para o estudo das línguas neolatinas, e não uma disciplina isolada dos estudos filológicos de seu clima de opinião. A publicação da gramática superior parecia apresentar uma certa urgência, em que se nota o autor justificando o fato de a obra não conter um capítulo sobre estilística e sobre metrificação, temas comumente editados após o capítulo de sintaxe, nas gramáticas de língua portuguesa de seu contexto.

O latim era considerado a “língua-mãe” das línguas românicas, ou neolatinas, no contexto do método histórico-comparativo, era considerado uma “língua-irmã” do grego antigo, e por fim, uma “língua-filha” do indo-europeu:

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Durante o século XIX a Linguística estudou, basicamente, a mudança linguística. À semelhança da Biologia da época, a ponto de recorrer a uma nomenclatura própria dessa ciência, a Linguística classificava as línguas em grupos de famílias, tratando-as em termos de graus de parentesco (PIETROFORTE, 2012, p. 78).

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Essa perspectiva de estudo da mudança linguística pelo estudo diacrônico, ou da Linguística Histórica, era predominante à época de Madvig, em que Faria teve o seu aprendizado de língua latina e de língua francesa, suas principais línguas acadêmicas, além da língua portuguesa em que lecionava. Todavia, a percepção de Saussure de que a língua era um sistema de signos, ou uma estrutura, já era corrente, não tendo havido ainda uma gramática latina que abordasse a descrição do sistema linguístico do latim até a época de Faria, para emprego nas universidades públicas.

Os limites editoriais que foram acordados com Faria limitaram sua gramática a cerca de quinhentas páginas:

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Grande dificuldade, senão a maior, foi o limite imposto pelas próprias proporções do volume. que não deveria ultrapassar a média de umas quinhentas páginas de texto, com o que nos vimos constrangidos a eliminar do presente trabalho tôda uma parte, constituída pelas noções de estilística, e bem assim uma introdução ao estudo da métrica latina (FARIA, 1958, p. 3).

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O intuito da obra era cobrir toda a latinidade, isto é, era uma obra referencial que serviria para o estudo integral dos fatos da língua latina, o que torna a obra também como um item de consulta. Todavia, podemos criticar em parâmetros atuais a obra gramatical de Faria com um método didático de caráter enciclopédico, e até mesmo positivista, por tentar abarcar a totalidade de fatos da língua latina em uma só obra, o que pelo autor seria o rigor do método. Em parâmetros editoriais mais atualizados, o ideal é que uma nova obra que descreva a língua latina não seja muito extensa, a fim de dinamizar o processo de ensino-aprendizagem, ao mesmo tempo não é necessário que se faça uma única obra referencial que contenha todo o conteúdo didático, o que pode dificultar o ensino. Acreditamos que com a especialização dos Estudos de Linguagem é preferível que obras antes gramaticais sejam fracionadas em estudos mais específicos, em uma publicação seriada e bem exemplificada por textos na língua latina.

Faria chegou a comentar em seu prefácio a possibilidade de publicar outros volumes complementares da gramática, o que demonstra seu interesse por publicações seriadas e mais específicas, o que talvez não fosse comum no seu clima de opinião quanto a publicações acadêmicas:

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Deixaremos para mais tarde a sua publicação que, sendo em volumes distintos, poderá ganhar um pouco em amplitude, permitindo assim melhor desenvolvimento da matéria. Aliás, tanto um assunto como o outro constituem disciplinas verdadeiramente autônomas e independentes do domínio gramatical, de sorte que não os incluir aqui não chega a constituir falha grave para a qual não possamos contar com a benévola benignidade do leitor (FARIA, 1958, p. 3).

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O emprego da formulação “benévola benignidade do leitor” soa como uma leve ironia, uma nuance de crítica à política editorial de sua época. A ideologia desenvolvimentista que era característica da retórica nacional à época também está presente em sua gramática, que buscava o “progresso dos estudos latinos” no país (FAUSTO, 2006). Essa retórica progressista, que constituía a ideologia da época dos anos 1950 no Brasil, era empregada de forma mais ampla pelas universidades e pelo discurso científico, o que Faria também adotou por aderência ao pensamento então vigente.

Sua percepção era de que o ensino de latim era uma das tarefas para o progresso da ciência em nível nacional, e que essa tarefa não se desenvolvia plenamente por conta de uma “lacuna” bibliográfica. Ainda que no contexto de Faria fossem abundantes as publicações acadêmicas para o ensino de latim, não considerava o latinista as obras publicadas no Brasil de meados do século XX como “gramáticas superiores”, isto é, textos que apresentassem referencial teórico adequado para a descrição da língua latina. Nesse sentido, apenas a obra de Madvig, traduzida por Epifânio Dias e editada em 1872 era o texto mais próximo de uma reflexão científica para o ensino de latim. Todavia, era uma edição de difícil acesso à época de Faria:

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Julgamos sinceramente que com a elaboração desta obra viemos trazer nossa contribuição para o progresso dos estudos latinos em nosso país, preenchendo uma lacuna de há muito existente em nossa bibliografia especial da matéria. Feita exceção da Gramática Latina de Madvig, traduzida primorosamente da terceira edição alemá por Epifânio Dias, não há em português uma gramática realmente superior da lingua latina. Mas, datando de 1872 a publicação portuguêsa da obra de Madvig, não só se tornou raríssima e de dificil aquisição, como também, pelo lapso de tempo decorrido, em muitos pontos se acha hoje ultrapassada (FARIA, 1958, p. 3).

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Atualmente, a própria gramática de Faria encontra-se em mesma situação que a de Madvig em sua época, sendo uma obra de difícil aquisição e relativamente ultrapassada teoricamente em alguns pontos. Cumpre salientar que a Gramática Superior da Língua Latina foi publicada em 1958, no mesmo clima de opinião da Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB), de 1959 (FARACO, 2016). A descrição linguística de Faria da língua latina aproxima-se muito da visão teórica da NGB, o que deu uma sobrevida à sua obra gramatical, que foi reeditada em 1992.

É possível que um estudante atual que conheça a tradição gramatical da NGB na descrição da língua portuguesa possa estudar a língua latina pela gramática de Faria, todavia, em sua obra não há as inovações mais recentes dos Estudos de Linguagem. A busca de Faria por uma obra de cunho enciclopédico, que abarcasse a totalidade de fatos da língua latina, tornou a obra densa e pouco didática, se comparada aos métodos escolares, por exemplo. Sem o ensino de latim na educação básica, a obra tornou-se um texto de aprofundamento do estudo do latim no contexto atual.

A descrição da língua latina na obra tem como objeto de estudos o “período clássico”, isto é, o estado da língua latina que geralmente é situado no período entre o final da República romana antiga e o início do Império romano, que tem como marcos temporais obras como as de Cícero, Virgílio e Horácio:

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Na explanação da matéria procuramos com a maior objetividade apresentar o estado da lingua principalmente em seu período clássico, procurando sempre distinguir os empregos, quando divergentes, da prosa e da poesia, ou mesmo da lingua familiar e da lingua popular. Isto é o que constitui a parte meramente expositiva do trabalho. Segue-se a cada capítulo, sistemàticamente, um "Complemento", destinado a dar do assunto uma visão histórica, ou a discutir com maior amplitude uma teoria controvertida, apresentando e discutindo as opiniões das mais abalizadas autoridades (FARIA, 1958, p. 3-4).

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Os gêneros textuais são divididos em prosa e poesia, e a língua em variação clássica, familiar e popular, o que era típico dos estudos filológicos que levavam em consideração a historicidade da língua latina, no chamado latim vulgar. Os comentários teóricos mais aprofundados na gramática ficam situados em um subcapítulo ao final de cada capítulo intitulado “Complemento”, que tratava de questões históricas da língua latina. Essa abordagem de Faria era um diferencial de sua obra, que continha como referência as principais obras de Filologia Clássica de sua época do contexto europeu.

A visão histórica a que Faria alude é a Filologia e o Método Histórico-Comparativo, que vincula os estudos de língua latina aos estudos do indo-europeu e ao estudo da História da Língua Portuguesa. A obra de Faria situava o latim como um “estado de língua”, ou uma isoglossa em termos coserianos (BECHARA, 2010), que poderia ser delimitada historicamente. É interessante o fato de que sua descrição da língua latina pressupunha abordar o latim clássico, aquele registrado textualmente, mas lembrar ao estudante que o latim familiar, ou a língua popular, também rotulado como latim vulgar por outros filólogos, era um tema de interesse para os latinistas. A visão filológico-linguística (CAVALIERE, 2022) de Faria sobre o estudo do latim conectava o estudo da língua às outras línguas românicas, no curso de Letras da primeira metade do século XX.

Uma outra questão, relativa ao método empregado por Faria na redação de sua gramática, diz respeito ao corpus de descrição e de análise linguística de sua obra gramatical latina, que seguindo a tradição gramatical deste tipo de obra se apoia nos autores da antiga Roma. Quanto ao corpus descritivo da gramática, ele é composto por autores do latim arcaico, da época da República e os “imperiais”:

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Uma de nossas preocupações máximas, tanto numa parte como noutra, foi a de sempre apresentar uma documentação segura e abundante, colhida nos mais significativos autores latinos de todas as épocas da lingua, incluidos, pois, os arcaicos, como principalmente Plauto e Terêncio, e os imperiais, como Tito Livio, Séneca, Tácito etc. Tal riqueza e amplidão de citações poderia dar uma primeira impressão de ter sido o método histórico da exposição transgredido, pela confusão indiscriminada dos exemplos selecionados em autores pertencentes a vários periodos do latim (FARIA, 1958, p. 4).

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Faria comenta que o emprego de um corpus textual de períodos históricos diferentes pode fugir ao rigor do método histórico da exposição de fatos da língua latina, pois podem confundir o leitor ao colocar lado a lado fontes de períodos históricos diferentes, todavia, em sua gramática não ocorre essa confusão, tendo em vista que os fatos da língua latina são comentados de acordo com o período histórico, inclusive com a demonstração por analogia de fatos de períodos históricos diferentes. Faria situa o que é próprio do período arcaico da língua e o que próprio do período clássico, sobretudo para demarcar o que eram os arcaísmos do período clássico.

O interesse pelas fontes do período arcaico da língua latina parece-nos uma estratégia para abordar a perspectiva histórica da língua latina, a comparação entre Plauto e Terêncio com os autores das épocas do final da República e do início do Império romano. Essa estratégia para a organização do conteúdo histórico dos fatos da língua latina era um modo também de valorizar o estudo de um cânon maior de autores literários latinos, com os avanços das edições críticas que chegavam ao Brasil, sobretudo as edições francesas Les Belles Lettres, particularmente influentes no Estado do Rio de Janeiro.

Faria justifica o estudo da história da língua latina através dos autores latinos, em um cânon que vá do latim arcaico ao período imperial, a fim de demonstrar o fenômeno da mudança linguística na língua latina, como um tópico avançado dos estudos filológicos:

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Entretanto, essa impressão seria mais aparente do que real, pois que os exemplos dados representam uma documentação imprescindível da explanação histórica, revelando de um lado como determinadas construções são antigas e persistentes na lingua e não peculiares únicamente ao periodo clássico, e de outro servindo para mostrar a evolução sofrida por certas formações morfológicas ou sintáticas através da própria língua (FARIA, 1958, p. 4).

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É digno de nota que essa preocupação pela perspectiva histórica estava vinculada aos estudos de Filologia Românica que contrastavam o latim com o português. Para Faria, o latim seria o vínculo para os estudos do indo-europeu, compondo com o ensino da história da língua portuguesa um estudo complementar da perspectiva filológico-linguística a que alude Cavaliere (2022), em seu clima de opinião. Por fim, uma questão tratada no prefácio da obra acerca das “Indicações Bibliográficas” nos demonstra como referências teóricas eram citadas em seu contexto de atuação. Como a gramática já é do período filológico-linguístico, de meados do século XX, suas fontes bibliográficas são referenciadas. Faria optou por citar textos internacionais escritos em diversas línguas, como o francês, inglês e espanhol, tendo citado algumas poucas referências em alemão e praticamente nenhuma referência nacional. As indicações bibliográficas vinham acompanhadas de curtos comentários, com finalidade didática:

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Enfim, cada capítulo vem igualmente sempre encerrado com as "Indicaçoes Bibliograficas", onde são citados com as respectivas pa- ginas os principats tratados referentes ao assunto estudado, especial mente os redigidos em frances, ingles e espanhol, linguas mats accessíveis aos nossos estudantes. Tais "Indicações Bibliográficas" são evidentemente sucintas, atendendo as finalidades da obra, limitando-nos, como dissemos, a citar únicamente os principais tratados, eliminando por isso sistemáticamente os artigos de revista, sempre mais dificilmente encontrados, como também alguns livros de mais restrita especialização e por isso mesmo de consulta mais dificil (FARIA, 1958, p. 4).

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A única gramática com circulação nacional citada por Faria em sua gramática foi a obra de Madvig, com tradução de Epifânio Dias, sendo esta considerada a obra que Faria utilizou como ponto de ancoragem para conceber uma nova gramática. Seu objetivo era atualizar o pensamento linguístico do gramático europeu, em um contexto de atuação que já exigia uma nova obra na perspectiva filológico-linguística.

4. Conclusão: o ensino de latim no Brasil: ontem, hoje e amanhã

As reflexões de Ernesto Faria nos auxiliam a debater as perspectivas das disciplinas de língua e de literatura latina no Brasil, seu ensino e didática. Na obra Introdução à Didática do Latim (FARIA, 1959), Faria desenvolveu reflexões sobre a tradição do ensino de latim no Brasil, uma tradição de longa data sempre contínua, desde o século XVI, no contexto do início da implantação da língua portuguesa no Brasil. O latim como uma língua natural foi um estado de língua, uma isoglossa, da antiga civilização romana, cujo império existiu nos três continentes do chamado mundo antigo: na Europa, na Ásia e na África, tendo sido a língua latina uma língua natural até a queda de Roma.

Quando o latim como língua natural foi sendo substituído na antiga România por romances, línguas derivadas do latim, sobretudo no contexto europeu, o ensino de língua latina foi instrumentalizado pela teologia cristã ocidental. O ensino de latim teve continuidade no contexto europeu como disciplina instrumental da teologia durante a Idade Média ocidental. Esse ensino perdurou até o Iluminismo, quando o latim se tornou língua instrumental da Filosofia racionalista e base do Direito moderno.

Após o surgimento da Filologia Românica, e do método histórico-comparativo, o latim passou a ser estudado como língua instrumental do estudo filológico, o que reverberou até a obra de Faria, em que o latim era uma disciplina de apoio para o estudo da língua portuguesa no contexto universitário dos cursos de Letras. Atualmente, podemos pensar em uma orientação didática em que o latim seja tratado como língua instrumental para o estudo da Linguística, o que configura um novo estado de coisas em nosso clima intelectual.

Agradecimentos

Agradecemos o apoio oferecido pela CAPES/PROEX/ PosLing UFF e da FAPERJ, para a realização do presente estudo.

Informações Complementares

Conflito de Interesse

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

Declaração de Disponibilidade de Dados

Os autores declaram que todos os dados relativos ao artigo estão disponíveis no mesmo.

Fonte de Financiamento

Fontes de financiamento: bolsa CAPES/PROEX/ PosLing UFF e auxílio da FAPERJ para participação em congresso (XIII Interab).

Referências

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Avaliação

DOI: https://doi.org/10.25189/2675-4916.2024.V5.N2.ID748.R

Decisão Editorial

EDITOR 1: Ronaldo de Oliveira Batista

ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7216-9142

FILIAÇÃO: Universidade Presbiteriana Mackenzie, Pernambuco, Brasil.

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EDITOR 2: Jorge Viana de Moraes

ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9096-7079

FILIAÇÃO: Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil.

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CARTA DE DECISÃO: O artigo apresenta-se relevante na tradição contemporânea de estudos em historiografia linguística por colocar em discussão autores considerados exemplares de um momento histórico. O tratamento das fontes primárias (complementado por importantes relações com fontes paralelas de observação) evidencia adequadamente aos leitores procedimentos de retomada crítica de problemas tratados ao longo da história brasileira de conhecimento linguístico.

Rodadas de Avaliação

AVALIADOR 1: Alessandro Jocelito Beccari

ORCID: http://orcid.org/0000-0001-6230-741X

FILIAÇÃO: Universidade Estadual Paulista, São Paulo, Brasil.

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AVALIADOR 2: Fábio da Silva Fortes

ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4411-7115

FILIAÇÃO: Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil.

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RODADA 1

AVALIADOR 1

2024-02-09 | 11:51 AM

O artigo oferece uma reflexão a respeito da elaboração de uma narrativa historiográfica acerca da história da gramática latina no Brasil e sobre o latim na formação de filólogos e linguistas. Fundamenta-se nos pressupostos teóricos e metodológicos da Historiografia Linguística; toma como modelo (meta)historiográfico a recente publicação de Ricardo Cavaliere (UFF/ABL) (2022) sobre a história da gramática no Brasil. Os assuntos analisados são a gramaticografia de Ernesto Faria (1906-1962) e suas ideias sobre o ensino do latim. O artigo tem como público não só pesquisadoras e pesquisadores da área dos Estudos Clássicos, especialistas em Língua e Literatura Latinas, mas também um público mais amplo, já que tange à importância do ensino do latim na atualidade.

O trabalho é relevante e original ao propor uma discussão embasada em escritos de Ernesto Faria, em especial em sua Gramática Superior da Língua Latina (1958), em cujo prefácio encontra-se uma proposta metodológica para o ensino do latim com base nos resultados dos estudos filológicos e histórico-comparativos e como preparação para eles. À Gramática Superior da Língua Latina seguiu-se a Introdução à Didática do Latim (FARIA, 1959), obra em que se desenvolvem as reflexões iniciadas na gramática. Depreende-se do artigo que o pensamento de Faria é importante subsídio para a discussão de propostas de adequação teórica do ensino e aprendizagem do latim aos estudos linguísticos nos dias de hoje.

No artigo, faz-se uso consistente da Gramática Superior da Língua Latina (1958), gramáticas anteriores aos trabalhos de Faria ou por ele discutidas, bem como os materiais supracitados. Utilizam-se as noções e princípios dos mais importantes teóricos da Historiografia Linguística: Konrad Koerner (2014) e Pierre Swiggers (2013; 2019). Como mencionado anteriormente, toma-se como modelo para a narrativa (meta)historiográfica a recente publicação de Cavaliere (2022) sobre a história da gramática no Brasil.

Ressalte-se que o artigo apresenta reflexões que serão desenvolvidas no projeto de pesquisa Latim para linguistas: história, política e ensino, no ano de 2024, na Universidade Federal Fluminense (UFF), no âmbito do grupo de pesquisas Filologia, línguas clássicas e línguas formadoras da cultura nacional (FILIC/CNPq/UFF), vinculado a atividades de pesquisa e de docência no Programa de Pós-graduação em Estudos da Linguagem da UFF, bem como à experiência docente na graduação. Assim, trata-se de uma discussão que nasce como resposta pragmática a questões atuais acerca da história da gramática latina e do ensino e aprendizagem do latim. Ademais, observe-se que a proposta de estudo das reflexões de Ernesto Faria a respeito da historiografia da gramática latina e o ensino do latim como disciplina de formação para a filologia é nítida na argumentação.

O texto é objetivo, formalmente bem estruturado. Segue a metodologia dos trabalhos da área da Historiografia Linguística, aplicada a uma questão relativa à história da gramática latina no Brasil e a seu impacto para os estudos da filologia e da linguística. Os resultados alcançados na discussão e análise são coerentes com os objetivos; as referências são relevantes e adequadas aos objetivos propostos.

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AVALIADOR 2

2024-03-13 | 12:04 PM

A carência, especialmente no Brasil, de estudos linguísticos acerca do latim que estejam afinados a perspectivas teóricas atualizadas, sem dúvida repercute no modo como essa língua clássica é ensinada nos cursos de graduação em Letras e Linguística e no modo como ela pode contribuir para a formação do linguista ou do professor de línguas. Nesse sentido, ao recuperar a contribuição que o filólogo Ernesto Faria (1906-1952) deu nesse campo no século passado, os autores do artigo propõem revitalizar uma agenda investigativa que, sem dúvida, seria promissora tanto para os Estudos Clássicos, quanto para a Linguística do século XXI.

Apresentando-se como uma introdução a um projeto de maior fôlego, a contribuição insere-se, lato sensu, na perspectiva da Historiografia da Linguística e se organiza coerentemente em três partes: uma introdução, em que se apresenta um diagnóstico e um panorama do campo, com a indicação de certa carência de estudos linguísticos atualizados acerca da língua latina em português; uma contextualização histórico-conceitual da obra de Ernesto Faria, com ênfase na sua relação com a gramaticografia latina e portuguesa brasileiras, e com uma certa delimitação meta-historiográfica da proposta apresentada; e, por fim, uma análise do prefácio da Gramática superior da língua latina.

Nessa terceira parte, que é a mais extensa, os autores discutem a filiação teórico-filosófica da obra de Faria, revelando sua relação com outras contribuições didáticas do latim coetâneas. É interessante observar que a ausência de referência a autores lidos e estudados à época, como Ravizza, Augusto Magne e Vandick Londres da Nóbrega supõem o alinhamento da obra de Faria a um projeto de tornar o seu ensino uma disciplina “científica”, laica e secularizada, em linha com desenvolvimentos da Filologia e da Linguística Histórica, não obstante esse esforço já revelasse, como os autores apontam, uma ancoragem já datada do ponto de vista teórico.

O artigo cumpre o que propõe e representa uma contribuição efetiva para a área. Por se apresentar como uma “introdução”, o estudioso ou estudiosa de latim, professor ou discente, esperará, certamente, ver sair a lume os próximos passos dessa pesquisa.

Como sugestões, proponho, particularmente, a revisão do texto no que diz respeito a dois aspectos bem pontuais:

  1. em que pese a escassez de estudos linguísticos atualizados a perspectivas teóricas contemporâneas do latim, já existem, nas últimas décadas, algumas iniciativas nesse sentido. Apenas como exemplificação, cito o volume 23, n. 1 (2019), da Revista Veredas (UFJF), inteiramente dedicado à Linguística Latina (modelos, interpretações e análises linguísticas (https://periodicos.ufjf.br/index.php/veredas/issue/view/1378) e os trabalhos de Gonçalves e Armelin (https://periodicos.ufba.br/index.php/estudos/article/view/28181/19080). Seria conveniente que os autores fizessem um levantamento bibliográfico desse campo, ao menos no Brasil. O panorama descrito, embora ainda real se visto comparativamente com o português ou outras línguas, tem-se tornado menos dramático no que diz respeito ao latim, carecendo talvez, um esforço de organização desses estudos e sua divulgação entre latinistas.
  2. Entre as páginas 4 e 5, os autores afirmam: “O objeto de estudos em questão pode ser definido como uma latinização do pensamento linguístico no Brasil, o que ocorreu pelo ensino de gramática latina durante vários séculos até o surgimento da Linguística como ciência e a constituição do português brasileiro, sob influência da gramática latina. Pode-se perceber que o latim foi perdendo a sua centralidade no ensino de línguas do Brasil ao longo dos séculos, tendo se tornado uma disciplina instrumental para o ensino de língua portuguesa, e atualmente para os Estudos de Linguagem, na perspectiva analítica que propomos”. Não está totalmente claro a que os autores se referem com a expressão “latinização do pensamento linguístico no Brasil”. Proponho que definam com mais clareza a expressão. No mesmo parágrafo, falta referência para a afirmação da perda de centralidade do latim e de sua transformação em disciplina instrumental.

Resposta dos Autores

DOI: https://doi.org/10.25189/2675-4916.2024.V5.N2.ID748.A

RODADA 1

2024-06-18

Prezados colegas,

Em primeiro lugar, gostaríamos de agradecer pelos pareceres e pelas sugestões para a redação do artigo. Fizemos todas as inclusões sugeridas, indicadas no texto destacado. Incluímos as alterações sugeridas e citamos a recém-fundada Associação Brasileira de Professores de Latim (ABPL), que tem buscado fomentar esse debate entre a Linguística e a Língua Latina.

Buscamos elucidar a questão da latinização do pensamento linguístico, que é um tema sugerido pela interpretação da obra de Ernesto Faria. Por fim, acrescentamos as informações solicitadas e incluímos ambas as referências que foram de muita valia para o nosso texto.

Com os melhores cumprimentos,

Os autores.

How to Cite

FERREIRA KALTNER, L.; CARDOZO SILVA DOS SANTOS, M. Ernesto Faria (1906-1952) and Latin for the Education of Philologists and Linguists in 20th Century Brazil: Historiographical Analysis. Cadernos de Linguística, [S. l.], v. 5, n. 2, 2024. DOI: 10.25189/2675-4916.2024.v5.n2.id748. Disponível em: https://cadernos.abralin.org/index.php/cadernos/article/view/748. Acesso em: 18 oct. 2024.

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