Resumo para não especialistas
Existe uma ideia bastante comum de que a obesidade é romantizada, apesar de ser listada como uma doença que precisa de tratamento. Isso é bem mais frequente em relação ao corpo de mulheres gordas e/ou obesas. Sendo assim, neste estudo, analisamos palavras usadas em conteúdos produzidos no Facebook e no Instagram, que se referem ao corpo feminino gordo, para verificar se há mesmo um olhar romantizado para ele. Foi possível observar que a tal romantização da obesidade é apontada por alguns, nas redes sociais, que acreditam que corpos fora dos padrões de beleza não poderiam ter a mesma visibilidade e ocupar os mesmos espaços que os corpos magros ocupam, como, por exemplo, na dança ou nos esportes. As escolhas de palavras para se referir a corpos femininos gordos, nos dois conteúdos publicitários analisados, demonstram uma obrigação de mudança, de emagrecimento, de forma mais ou menos evidente, usando o fator saúde, muitas vezes, como pretexto. Na realidade, não é bem a saúde das mulheres gordas que preocupa, mas o fato de que seus corpos não são autorizados a existir em igualdade com os corpos ditos padrão, porque há quem lucre com a insatisfação da mulher com sua aparência.
Introdução
Debruçar o olhar sobre aspectos semântico-pragmáticos, em especial, sobre a escolha lexical para fazer referência a entes da realidade, nos remete a uma controvérsia antiga, que perpassa a análise linguística: a linguagem se refere a, representa ou funda realidades?
De acordo com Pietroforte e Lopes (2016, p. 114-115), remontando à concepção aristotélica, referencialista, temos que as palavras remetem a conceitos e estes, por seu turno, representam os entes existentes no mundo. Segundo essa noção, a realidade é pré-existente à nossa percepção, e o que fazemos, enquanto sujeitos que usam a linguagem, é “etiquetar” os componentes dessa realidade. Já conforme uma concepção saussuriana, retórico-hermenêutica, há a expansão da perspectiva referencialista, no sentido de que usar a linguagem é estabelecer relações entre o que se diz e o como se diz, entre significantes e significados. No entanto, não se nega que o sistema linguístico está a serviço de uma realidade que antecede o estabelecimento dessas relações e seu papel é representar essa realidade. Dentro de ambas as teorias, circula a ideia da universalidade do sentido.
Os autores ainda identificam uma terceira concepção, reconhecida como retórico-interpretativa e não referencialista: entende-se que o sujeito que usa a linguagem é quem produz os sentidos, ou seja, esse é um fenômeno humano, sócio-historicamente situado, sendo, portanto, variáveis, tanto a palavra quanto o conceito a ela vinculado. Nessa perspectiva, a universalidade do sentido se desfaz e é possível pensar que distintas realidades podem ser fundadas, mediante as experiências e conhecimentos dos sujeitos que lançam mão das possibilidades do sistema linguístico, para atender às suas necessidades comunicativas.
Não está no escopo desta pesquisa, ainda em andamento, trazer uma resolução para essa questão semântico-filosófica. No entanto, entendemos que, para dar conta da análise de discursos que são construídos e que circulam nas diferentes esferas sociais, não se pode prescindir do papel ativo dos sujeitos, nem da noção de que são eles, em interação, que constroem os diferentes efeitos de sentido que tais discursos podem suscitar, a depender das circunstâncias em que estes são (re)produzidos. Nesse sentido, a terceira concepção seria a mais adequada a esta investigação.
A Teoria Semiolinguística do Discurso, cunhada por Patrick Charaudeau, se insere e se expande no escopo da perspectiva retórico-interpretativa, e apresenta o fenômeno da produção linguageira mediante um “duplo processo de semiotização do mundo” (Charaudeau, 2005): a transformação de um “mundo a significar” em um “mundo significado” e o compartilhamento dessa realidade apreendida/ fundada entre sujeitos interactantes.
Seguindo essa esteira, mas, também, utilizando alguns dos pressupostos da Semântica Lexical (Greimas, 1976; Pietroforte; Lopes, 2016), nos propomos a analisar escolhas lexicais para fazer referências ao corpo feminino gordo, no sentido de refletir sobre um discurso muito comum na atualidade, relativo à romantização da obesidade, ou seja, a ideia de uma mudança de atitude e de pensamento em relação ao ser gorda/obesa, sendo, agora, visto como algo positivo e endossado. Para isso, lançamos nosso olhar para dois conteúdos produzidos em plataformas digitais, tais como o Facebook e o Instagram, disponibilizados a milhares/ milhões de pessoas diariamente, em que o corpo feminino gordo é avaliado e (des)autorizado a existir, circular e ocupar os mesmos espaços que os corpos magros ocupam.
1. A semiotização do mundo, o discurso e os imaginários sociodiscursivos
Torna-se necessário delimitar alguns conceitos com que trabalhamos em nossa análise, pois, como foi explicitado na introdução, diferentes abordagens podem resultar em diferentes encaminhamentos. Como estamos lidando com a Teoria Semiolinguística do Discurso, como fundamento teórico-metodológico, apresentamos, aqui, três noções essenciais dessa teoria, quais sejam: o processo de semiotização do mundo, o fazer discursivo e os imaginários sociodiscursivos.
Quanto ao processo de semiotização do mundo (Charaudeau, 2005, p. 13-14), já foi explicitado anteriormente que a produção linguageira constitui-se de um evento em duas etapas – a transformação e a transação –, não necessariamente estanques ou fragmentadas, podendo ser sobrepostas. O sujeito comunicante coloca-se diante de uma matéria bruta, o “mundo a significar”, por ele transformado em “mundo significado”, por meio de operações em que ele lança mão do sistema da língua, seu léxico e sua gramática, para compor um projeto de fala. Esse mesmo sujeito organiza essa matéria linguística de acordo com sua intencionalidade, num movimento de transação com outro(s) sujeito(s), seu(s) interlocutor(es), fazendo desse “mundo significado” um “objeto de troca”, já linguisticamente transmutado.
Esse processo está implicado no fazer discursivo, na medida em que não há produção de discursos sem que haja transformação do mundo em linguagem e da linguagem em objeto e espaço entre sujeitos em interação, a que Charaudeau denomina “mise-em-scène”, ou “encenação discursiva” (Charaudeau, 2008, p. 75-77). O discurso seria, então, um evento enunciativo, em que figuram sujeitos psicossociais, que se projetam em um circuito de compartilhamento de experiências linguageiras, que, por seu turno, envolvem suas identidades fora e dentro desse circuito, bem como um contrato tácito para que tal compartilhamento tenha êxito. Esse contrato, por seu turno, configura-se como um espaço de restrições, que regulam a forma como a comunicação ocorre, e um espaço de estratégias, empregadas pelos interlocutores em direção ao sucesso desse ato comunicativo (Charaudeau, 2008, p. 56-57). O conceito de “encenação” se coloca aqui, porque, na medida em que os sujeitos interagem, devido às restrições do contrato, agem linguisticamente a partir de uma imagem projetada para aquele evento enunciativo.
Esse fazer discursivo, por sua vez, resulta em imaginários sociodiscursivos, que são assim definidos por Charaudeau (2017, p. 578):
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O imaginário é uma forma de apreensão do mundo que nasce na mecânica das representações sociais, a qual, conforme dito, constrói a significação sobre os objetos do mundo, os fenômenos que se produzem, os seres humanos e seus comportamentos, transformando a realidade em real significante. Ele resulta de um processo de simbolização do mundo de ordem afetivo-racional através da intersubjetividade das relações humanas, e se deposita na memória coletiva. Assim, o imaginário possui uma dupla função de criação de valores e de justificação da ação.
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Na interação, são engendrados e consolidados os discursos que remetem a crenças e saberes comuns nas comunidades de fala, repletos de simbolizações, de subjetividades e de estereotipações. Como exemplo, pertinente a esta pesquisa, então, analisemos os imaginários sociodiscursivos em torno do corpo, do corpo feminino e do corpo feminino gordo.
2. Os corpos: um conceito recente com múltiplas perspectivas
Jean-Jacques Coutine, na obra Decifrar o corpo: pensar com Foucault ([2013], 2021, p. 12), afirma que, sob um prisma filosófico, no âmbito das correntes racionalistas e espiritualistas, o corpo permaneceu em segundo plano, até, aproximadamente, o século XX. Já no que tange à sua categorização no campo da medicina e das ciências naturais, não é possível dizer o mesmo, visto que, desde sempre, reconhecia-se, como necessidade, a tarefa de disciplinar os corpos, por meio da cura e da (re)educação. Dessa forma, entendemos que, no campo conceitual, atinente às ciências humanas e da linguagem, o conceito de corpo permaneceu opaco por muito tempo ao longo da história.
Desde que se começou a problematizar esse conceito, no entanto, podemos notar que ele se desdobra em múltiplas perspectivas, e, consequentemente, em diferentes discursos sobre ele, como afirma Charaudeau (2017, p. 580):
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O médico, examinando-o [o corpo], tateando-o, apalpando-o, produz um discurso que o torna um lugar de aparição de sintomas: é o imaginário médico de “traço” ou de “indicialidade” como pesquisa de uma significação escondida sob a manifestação de um signo. Mas o biólogo considera o corpo através de um imaginário “tecidual” e “celular”, e o psicanalista o considera como um lugar de “somatização”.
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Tais imaginários sociodiscursivos se interseccionam e derivam-se em novas noções, que, por sua vez, são atualizadas, na medida em que se modificam os contextos históricos. Se, no início do século XX, por exemplo, o ideal de padrão corporal foi-se modificando, culminando no ideal de magreza, para as mulheres, e de tônus muscular, para os homens, podemos observar que nem sempre foi assim. Esses ideais remetem a crenças e simbologias, que, por sua vez, são reforçadas pela indústria farmacêutica e de cosméticos – a indústria da beleza (da qual trataremos mais adiante).
Em termos filosóficos, portanto, Danilo Corrêa Pinto (2016, p. 63), sugere que
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Podemos pensar o corpo como a junção de alma e carne; aquilo que nos faz humanos e divinos em alguns discursos religiosos. Por outro discurso, como o das ciências biomédicas, o corpo biológico, organismo vivo biomecanicamente funcional, possui condições e exigências básicas de existência humana, como comer, beber, dormir. No entanto, o corpo possui algo diferente quando o vemos no animal homem: ele possui linguagem e é linguagem, e se há linguagem, existem possibilidades de sentidos e não sentidos; um lugar de simbólico e espaço de movimento da história e das ideologias (Pinto, 2016, p. 63).
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Em outras palavras, o corpo é um ente que significa, é um “mundo a significar”, que, transformado em conceito e transacionado em forma de ente linguístico, “mundo significado”, povoa os imaginários sociodiscursivos ao longo da história. Ou seja, não se pode ignorar sua dimensão simbólica.
3. Os corpos femininos: os ideais de beleza
A obra O mito da beleza, de Naomi Wolf, foi, no ano de sua publicação (1991)[1] um importante marco para o movimento feminista, que estaria em sua terceira fase, ou terceira “onda”[2]. Nela, a autora tece uma crítica ao ideal de beleza imposto para o corpo das mulheres, fortalecido não apenas pela sociedade fundada em princípios patriarcais, em que a mulher estaria a serviço do prazer e do protagonismo masculino, como também pelo mercado, que fez do corpo e da existência da mulher uma de suas principais fontes de lucro (senão a principal) – um mercado projetado por e para homens. Wolf faz uma descrição minuciosa do que é o mito da beleza, como e para que fins ele se estabelece e toma conta de todas as áreas da vida das mulheres:
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Pesquisas recentes revelam com consistência que, no mundo ocidental, entre a maioria das mulheres que trabalham, têm sucesso, são atraentes e equilibradas, existe uma “subvida” secreta que envenena nossa liberdade: impregnada de conceitos de beleza, ela é um escuro filão de ódio a nós mesmas, obsessões com o físico, pânico de envelhecer e pavor de perder o controle” (Wolf, 2019, p. 26).
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Para a autora, esses conceitos de beleza configuram-se em um “sistema monetário semelhante ao padrão-ouro”. Sendo assim, constitui-se, mediante determinações político-ideológicas, “no último e melhor conjunto de crenças para manter intacto o domínio masculino” (Wolf, 2019, p. 29). Os imaginários sociodiscursivos vigentes em torno dos corpos femininos atendem, portanto, a uma lógica social e mercadológica que visa à manutenção do patriarcado (que se pauta em um padrão heternormativo). Surge, assim, o questionamento e a conclusão de que o mito da beleza se configura como um espartilho invisível do mercado[1], para o controle dos corpos femininos, de sua existência, de seus movimentos, de suas ações.
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Se o mito da beleza não se baseia na evolução, no sexo, no gênero, na estética, nem em Deus, no que se baseia então? Ele alega dizer respeito à intimidade, ao sexo e à vida, um louvor às mulheres. Na realidade, ele é composto de distanciamento emocional, política, finanças e repressão sexual. O mito da beleza não tem absolutamente nada a ver com as mulheres. Ele gira em torno das instituições masculinas e do poder institucional dos homens (Wolf, 2019, p. 30-31).
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Nesse sentido, a expectativa de homogeneização das formas femininas, segundo um padrão de beleza, não se trata de um “mundo a significar”, não é uma realidade natural, já dada, mas se trata de um “mundo (re)significado”, atravessado por crenças e, especialmente, por interesses de um determinado grupo social que, historicamente, tem mantido uma relação de poder marcadamente assimétrica, em que mulheres são subalternizadas e homens são superiorizados.
4. Corpos femininos gordos
A história da construção dos discursos e imaginários em torno do corpo feminino não pode ser vista como um processo homogêneo, mas é possível afirmar que nem sempre a necessidade de emagrecer foi naturalizada, como o é atualmente. Durante a Idade Média, antes do que pode ser considerado “a era da magreza”, cultivavam-se imaginários que se encantavam com a acumulação, com motivações socioeconômicas, evidentemente, pois havia a predominância de cenários de escassez e de fome. Segundo Vigarello (2012, p. 29), “o ‘gordo’, na intuição antiga, impõe-se de imediato. Ele impressiona. Seduz. Sugere também uma incarnação da abundância, indica riqueza, simboliza saúde. Sinais decisivos num universo em que reina a precariedade, senão a fome”.
A partir da Renascença, no entanto, o olhar avaliativo sobre a aparência física foi-se modificando, e isso teve grande influência da arte. Ao serem retratados e esculpidos, os corpos passaram a ser vistos, expostos em detalhes, apreciados com olhares demorados, e, consequentemente, suas formas passaram a ser pensadas mediante uma atitude mais avaliativa. Começou-se, então, a associar maior volume corporal a comportamentos, tais como a lentidão e a preguiça, ou até a limitações cognitivas. Os “cuidados” com os corpos gordos acentuam-se, concentrando-se mais em regimes e na contenção do seu volume, por meio de cintas e corpetes para as mulheres (Vigarello, 2012, p. 65).
A leveza se coloca como padrão a ser valorizado e buscado, para o homem, porque simbolizava a elegância, o garbo, a agilidade; para a mulher, porque simbolizava a beleza e a delicadeza, atributos indispensáveis para alcançar a condição de casada – o ideal de realização pessoal estabelecido à época. No plano das expressões linguísticas, assim, novos termos são criados para fazer referência aos diferentes estados do ser gordo/a:
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Novidade mais profunda é que o aumento do desprezo [pela gordura] atinge a linguagem, fabrica expressões, desloca o horizonte das palavras. Uma cultura “negativa” do “volume” é cada vez mais declarada, ainda que indiferente às nuances ou à precisão numérica. Os “de porte pesado”, evocados desde o século XVI, são agora objeto de uma vingança repetitiva: todos “desprovidos de espírito”, “muito pouco sábios”, quando não “desagradáveis” (VIGARELLO, 2012, p. 72).
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Jimenez (2022) pontua que o afinamento da silhueta teria acompanhado o processo civilizatório, e Sant’anna (2014) aponta para uma mudança mais marcada de paradigma, em torno do padrão do corpo feminino – o magro –, a partir da década de 1930, quando, então, surgiu o “American way of life”. Foi consolidada, como centro das preocupações femininas, a necessidade de ser a escolhida para ser levada ao altar. Para isso, era preciso aumentar o interesse dos homens pelos corpos das mulheres, o que resultou em demasiadas preocupações com a aparência desses corpos.
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O vocabulário do escárnio masculino sobre as mulheres foi pródigo em expressões diretamente relacionadas à alimentação, à flora e à fauna. Se as belas já foram consideradas “rosas” e “brotos”, algumas se tornaram frutas apetitosas e até mesmo partes da carne bovina. Muito antes de aparecer a expressão “mulher filé”, já havia a “mulher bucho”. Difícil seguir os traços de sua história. A presença da bucho na imprensa é envergonhada diante das musas que têm os homens a seus pés. A aparição da bucho já foi contraponto à beleza, em piadas, canções populares e na literatura de cordel. Sempre vistas como estraga-prazeres, pobres-diabos, tão feias que mal parecem mulheres (Sant’Anna, 2014, p. 99).
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Se a existência da mulher considerada bela é endossada pela linguagem, a exclusão da mulher que está fora desse padrão de beleza igualmente o é, ou seja, existir fora dos padrões estéticos vigentes só é autorizado na invisibilidade e no silenciamento, fora do alcance de câmeras, da imprensa, da música, da literatura, das artes plásticas, esvaziadas do próprio ser e do sentir-se mulher. Ser “mulher bucho” é ser menos mulher do que ser “mulher filé”.
Contudo, se o ideal de beleza tem sido o magro (ainda que, em alguns tempos, mais, em outros, menos, mas sempre dentro do espectro da magreza), se a existência e a visibilidade da mulher gorda não são socialmente autorizadas, legitimadas, como, então, se pode justificar os discursos em torno da romantização da obesidade? Para responder a esse questionamento, faz-se necessário adentrar na temática relativa ao avanço das tecnologias de informação e comunicação.
5. O ciberespaço e os discursos no ambiente digital
Não está no escopo desta pesquisa proceder a uma discussão aprofundada sobre os impactos dos avanços tecnológicos das mídias de informação e comunicação (TICs) nas relações sociais. Nossa intenção, aqui, é lançar luz sobre a forma como a diversidade passou a ter seu lugar de fala, a partir do advento da world wide web e, principalmente, a partir do advento das plataformas virtuais conhecidas como redes sociais.
O sociólogo Manuel Castells, dede 2005, já apontava a emergência de um novo paradigma tecnológico, que se apoiaria em uma sociedade composta por relações organizadas em redes: a metáfora da rede, uma estrutura de nós interligados – os conhecimentos acumulados –, seria a representação de uma estrutura social interligada pelas tecnologias de informação e comunicação, criando-se, assim, um espaço de relacionamento entre coletividades. Essa reconfiguração da comunicação – em que teríamos passado de um sistema de mass media para um de multimídias (Castells, 2005, p. 24) – teria como característica uma fragmentação do poder sobre as ferramentas de produção e compartilhamento de conteúdos.
Pierre Lévy (1993; 1994; 1996)[1], por seu turno, antes dele, na década de 90, já problematizava as TICs e o ciberespaço, compreendendo-o como um lugar virtual de “interconexão”, de “criação de comunidades virtuais” e de “inteligência coletiva”. Nota-se, assim, um movimento de (co)criação de coleções de dados, numa dinâmica hiperinterativa e hipercolaborativa, que acaba por descentralizar a forma como os sujeitos produzem e consomem conteúdos e informações, bem como altera a forma como esses sujeitos se relacionam dentro e fora desse ambiente (Rojo; Moura, 2012).
Nessa perspectiva, e na esteira da globalização, da democratização de acesso à internet e da lógica dos streamings e algoritmos, que preveem o compartilhamento de textos verbais, imagéticos, produções audiovisuais, todas em tempo real, pessoas ao redor do mundo têm a possibilidade de se fazerem vistas e ouvidas, nas mais diversas plataformas virtuais.
Em 2004, surgia o Facebook, que se tornou febre no mundo ocidental. Em 2010, surgiu o Instagram, que, aos poucos, foi despovoando aquela plataforma, num processo migratório, principalmente de pessoas mais jovens, embora ambas as redes sejam, atualmente, utilizadas, e pertencentes à mesma empresa, a Meta. O Instagram oferece aos seus usuários uma experiência mais imagética e audiovisual do que de texto verbal. Com a chegada dos Reels, uma espécie de vídeos curtos, bem como a rolagem infinita, sem bordas, essa experiência imersiva se intensifica. É possível assistir a diversos vídeos dos mesmos autores, segui-los/as e receber notificações de novos conteúdos produzidos por eles/as.
E é nesse contexto que surgem duas noções: o Facebook/ Instagram como ambiente profissional, para os produtores de conteúdo (os influencers), que podem tratar de temáticas as mais diversas; e do Facebook/ Instagram como espaço de disseminação e reafirmação de imaginários sociodiscursivos, também os mais diversos. Essas noções trazem consigo consequências, como a possibilidade de criação das bolhas virtuais. Na medida em que um sujeito interage com e nas plataformas, consumindo determinado conteúdo, estas delineiam o perfil desse usuário e automatizam a entrega de mais conteúdos de mesmo padrão, sejam notícias, sugestões de páginas a seguir, anúncios publicitários, vídeos, coleções de imagens e memes.
Igualmente, nesse contexto, surgem algumas questões éticas sobre os limites, tanto da produção de conteúdos quanto da reação a esses conteúdos. Sim, porque é possível reagir de forma menos ativa, com um “like” na publicação, ou de forma mais ativa, com comentários sobre a publicação. Se, de um lado, existe a possibilidade da consonância, da concordância com o conteúdo oferecido a um público de cujo alcance não se tem controle, há, por outro lado, a possibilidade da dissonância, da discordância. E tudo isso é manifesto via linguagem, por meio de escolhas lexicais, que vão numa escala do amor ao ódio.
Voltando a tocar no ponto do circuito mercadológico subjacente às dinâmicas sociais e aos padrões que se estabelecem como “padrão-ouro”, salientado por Wolf (2019), se as plataformas virtuais, as mídias sociais, pertencem a uma empresa, e essa empresa, a um empresário (homem), logo, o objetivo de lucro está implicado nesse circuito. Quanto mais movimentado aquele ambiente, mais lucro para a empresa. Para atingir esse propósito, poderíamos dizer que vale quase (?) tudo. O ciberespaço se torna uma espécie de feira, de supermercado, onde se vende de tudo, produtos, serviços, dados e, até, pessoas.
Não pretendemos entrar no mérito jurídico dessa dinâmica, mas enfatizamos, aqui, o papel preponderante da publicidade. Os ambientes sociodigitais não são gratuitos: embora não se pague formalmente uma assinatura por eles, paga-se de outra(s) forma(s), e a presença massiva de campanhas publicitárias, em meio aos conteúdos consumidos, torna-se, também, um conteúdo a ser obrigatoriamente consumido, para se chegar aos demais. Enquanto na lógica da mass media, havia, na TV, a pausa para o comercial, ou, nas revistas impressas, as páginas destinadas às peças publicitárias, ambientes parcialmente controlados pelos donos das mídias e pelos consumidores, na lógica do ciberespaço, essas fronteiras estão dissolvidas.
Essa descrição se faz relevante para situar os discursos que circulam nessas plataformas e como os padrões de corpos são ali ratificados, seja por meio dos conteúdos produzidos e entregues às diferentes “bolhas”, seja por meio das reações a esses conteúdos, seja, principalmente, pela publicidade que incentiva, 24 horas por dia, mulheres a consumir produtos e serviços que prometem esse padrão estabelecido.
Vejamos como isso acontece, a partir da seleção de dois conteúdos explicitamente publicitários, produzidos em duas plataformas digitais distintas, uma, por uma influenciadora, e outra, por uma clínica de emagrecimento.
6. Uma análise semântico-discursiva: o léxico para referenciar o corpo feminino gordo em plataforma virtual
Como esta pesquisa se constitui em um recorte de uma investigação maior[1], ainda em andamento, já foram analisados muitos conteúdos veiculados nas plataformas mencionadas – Facebook e Instagram – com ênfase nos vídeos denominados Reels, bem como nos comentários relativos a eles. É possível afirmar que se observa uma gradação, no que tange às escolhas lexicais para referência avaliativa ao corpo feminino gordo, que pode variar desde o elogio à ofensa, como pode ser demonstrado no quadro a seguir:
| Elogio | Amenização | Abstenção avaliativa | Alarme | Humor | Insulto/ deboche |
|---|---|---|---|---|---|
| Curvilínea | Gordinha | Gorda | Obesa | Gorducha | Baleia |
| Gostosa | Fortinha | Corpulenta | Enorme | Rechonchuda | Bola/ bolota |
| Plus Size | Fofinha | Robusta | Imensa | Prenha | Balofa |
Cabe observar que as categorias em que os termos foram arrolados não são estanques, há uma matização, uma sobreposição entre elas, pois reconhecemos que o contexto de produção/ recepção deve ser considerado. Também é necessário pontuar que não se trata de uma lista acabada, mas apenas uma exemplificação, fruto de um levantamento prévio, a partir da observação dos conteúdos. O termo “gorda”, por exemplo, pode tanto figurar na categoria em que se procura apagamento axiológico, sem evidenciar um teor pejorativo nem elogioso, como pode se tornar um insulto, a depender da situação em que esteja inserido. Já a categoria do humor pode ser, facilmente, sobreposta à do deboche e do insulto, na medida em que se compreenda que não faz parte do escopo de um humor ético e responsável apontar as características físicas de alguém.
Vejamos, em seguida, os dois conteúdos elencados para análise.
Figure 1. 1. Anúncio publicitário – seca 360 by Maíra Cardi (Reel do Facebook)
Este é um anúncio de um plano de emagrecimento vendido pela influenciadora Maíra Cardi, o “Seca 360”[1]. Ela, em sua fala, faz uma descrição minuciosa da barriga – representada pela imagem – que ela apelida de “pochete” (num tom humorístico). Uma barriga que, na mulher, incomoda, e que não sai com facilidade, mesmo com dieta e exercício. Mas que, segundo ela, tem jeito de sumir, mediante a adesão ao seu programa de emagrecimento.
Chama a atenção não apenas essa escolha lexical, de nomear a barriga de “pochete”, como também a expressão “parece que tá prenha”, em que temos “prenha” como sinônimo de grávida, ou seja, a “pochete” que “não sai nunca” parece uma barriga de grávida, mas não uma grávida qualquer, visto que o termo prenha, embora seja usado para se referir à gravidez humana, é, talvez, mais comum para fazer referência à gravidez de outros animais (canídeos, suínos). O tom de deboche é bastante evidente na fala de Maíra Cardi, ao que parece, com a proposta de uma abordagem mais humorística.
Além dessas escolhas, palavras que se referem ao emagrecimento como uma obrigação sofrida são agenciadas, tanto na legenda quanto na fala da influencer: “emagrecer é sinônimo de restrição e sofrimento”; “essa pochete, numa mulher... mas incomoda”; “é desesperador”; “dá uma raiva”; “nunca mais vai embora”.
Os imaginários sociodiscursivos em torno do corpo feminino são fortemente agenciados nessa publicidade: sugere-se que emagrecer é uma necessidade de toda mulher, que todas as que têm a “pochete” estão fortemente incomodadas com ela e querem perdê-la; sugere-se que ter uma “pochete” é sofrer, é viver em restrição e dietas; sugere-se que o corpo magro é o alvo a ser alcançado para todas e que a “pochete” só incomoda quando se é mulher. O ideal de magreza é evocado, então, como solução para tamanho sofrimento e desespero.
Funda-se, assim, uma realidade em que a mulher está sempre em busca de um corpo esbelto, e, para isso, é capaz de qualquer coisa, uma realidade em que só existe realização, em que só se pode usar determinadas roupas, frequentar determinados lugares, se o volume corporal estiver em conformidade com o padrão vigente – o padrão magro, sem “pochete”.
Vejamos, então, um segundo conteúdo, publicado na plataforma Instagram.
Figure 2. 2. Publicidade produzida pela página Mente em Forma (Instagram)
Este conteúdo, produzido pelo Núcleo Multidisciplinar de atendimento a pessoas que precisam controlar o peso – o Núcleo Mente em Forma[1] –, tem uma intenção publicitária um pouco mais discreta do que na publicidade mais tradicional, pois se constrói a partir de um discurso “didático”, como é possível observar na explicação da legenda:
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Presta atenção no que eu vou falar aqui...
E entenda, de uma vez por todas, que somente o peso não é a melhor forma de avaliar o seu progresso. O mais importante é cuidar do seu interior, tanto física quanto mentalmente e, assim, o seu exterior irá acompanhar esse cuidado. Ou seja, mesmo que o seu objetivo seja, de fato, perder peso (por estética e/ ou saúde), não foque nisso. No meu acompanhamento nutricional, eu te ensino muitas técnicas práticas e eficazes para sua evolução, para ter mais saúde e qualidade de vida. Vem comigo? Marca uma consulta no direct!
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O sujeito enunciador é representado pelo amálgama da instituição com a profissional de saúde, a nutricionista que pode ser identificada na imagem da mulher vestindo um jaleco e que propõe o questionamento: “Será que só o peso importa?”
Ainda que o sujeito destinatário não esteja identificado explicitamente, pode-se perceber que se trata de um grupo de pessoas que está buscando mudanças em seu corpo, e que tem insistido em focalizar apenas a diminuição dos dígitos na balança. Essa insistência está pressuposta no enunciado: “E entenda, de uma vez por todas, que somente o peso não é a melhor forma de avaliar o seu progresso”. O emprego do termo “de uma vez por todas” aponta para a preexistência de outras vezes em que o assunto em tela foi abordado, assim como o uso do advérbio “somente” marca uma orientação argumentativa de dissuasão desse comportamento centrado na perda de peso acima de qualquer coisa, como representante de “progresso”. Não há um gênero determinado para esse sujeito, no entanto, é possível interpretar a imagem da nutricionista, uma mulher, sugira a identificação com o público feminino.
Chama a atenção a intencionalidade de amenizar o estigma de uma aparência física considerada socialmente inadequada, embora o próprio termo “progresso” sugira uma ideia de que há uma necessidade de melhorar algum aspecto relativo ao estado presente do corpo desse sujeito destinatário. É, então, estabelecido um contraponto entre um espaço “interior”, não visível desse corpo, tanto físico quanto mental, e um espaço “exterior”, visível, composto por uma aparência mais ou menos volumosa. Segundo a instância de enunciação, seria “mais importante” concentrar a atenção nos cuidados com esse espaço interno, para, assim, o externo “acompanhar esse cuidado”. Em outras palavras, a mudança corporal aparente é resultado de mudanças não perceptíveis aos olhos, pois dizem respeito ao funcionamento desse corpo, representado pelo emprego dos termos “saúde” e “qualidade de vida”.
Esse conteúdo, numa primeira aproximação, por não supervalorizar a magreza, pode ser considerado um discurso que estaria endossando a permanência de pessoas em sobrepeso e obesidade, já que não ratifica a perda de peso como marca indiscutivelmente associada à vida saudável e à realização pessoal. Contudo, numa análise um pouco mais cuidadosa das escolhas lexicais, pode-se notar que há, ainda, um encorajamento para o emagrecimento (“perda de peso”) e para a busca de resultados visíveis no “exterior”, sugeridos como parte do “progresso” perseguido, mesmo que não componham sua totalidade.
Muitas análises poderiam ser feitas, de conteúdos os mais diversos, mas, devido aos limites espaciais dados pelo gênero discursivo em que esta pesquisa se circunscreve, nos detivemos em analisar apenas duas peças.
7. Considerações finais – há a romantização da obesidade?
Os discursos em torno de uma suposta romantização da obesidade estão especialmente ancorados numa visibilidade alcançada por corpos não padrão, considerados com sobrepeso, que têm ocupado o ciberespaço. Pessoas gordas, em especial, mulheres, que se tornam influenciadoras, que são dançarinas, praticam esportes os mais diversos, ganhando medalhas, inclusive, desfilam em escolas de samba, tornam-se apresentadoras de programas, repórteres, atrizes, modelos. Mulheres que, antes, viviam na penumbra, tendo a legitimação de suas existências vetadas, atualmente, estão agindo, circulando em variados espaços e sendo vistas e sendo referências para tantas outras mulheres, com seus corpos “volumosos” e suas “pochetes”.
Naturalmente, tornaram-se, também, um nicho para o mercado e para a publicidade: roupas para corpos gordos/ obesos, que, há alguns anos, só eram encontradas no fundo das lojas de departamento, em cores neutras e em modelagens amplas, atualmente tornaram-se as modelagens plus size, podendo ser encontradas em lojas físicas e virtuais as mais diversas, para os mais diversos gostos e formatos. A diversidade de corpos, sim, ganha espaço, mas isso ocorre, principalmente, porque há quem lucre com isso e não porque os corpos femininos tenham deixado de ser controlados por um espartilho invisível.
Os distúrbios alimentares seguem em alto percentual na população mundial[1]. As indústrias de medicamentos, o setor fitness, as indústrias de cosméticos estão a todo vapor, incentivando o emagrecimento, o afinamento da silhueta (Jimenez, 2022).
Podemos, então, mediante a análise das duas peças publicitárias, nas plataformas do Facebook e do Instagram, chegar a uma constatação de que a obesidade não tem sido, de fato, romantizada, tendo em vista que os discursos que rejeitam portes físicos mais volumosos se mostram insistentes – ainda que de forma suavizada, como se percebe na diferença do teor das enunciações analisadas.
Se assumirmos, como sinônimos do termo “romantizar”, os vocábulos “fantasiar”, “idealizar”, podemos afirmar que a romantização de uma situação ocorreria na medida em que alguém imprimisse características a algo ou alguém, com o intuito de torná-lo mais interessante do que realmente é. E por que alguém teria essa intenção? Seria para convencer outras pessoas de que a situação ou pessoa em questão é melhor do que outras situações ou pessoas? Parece coerente esse encaminhamento.
Surgem, por fim, os questionamentos: as mulheres gordas romantizam sua condição de mulheres gordas/ obesas? Elas produzem conteúdos afirmando que seus corpos devam ser imitados, que devam ser padrão de beleza, que são melhores do que os corpos magros? Influenciadoras gordas montam programas de “engordamento” para serem adquiridos? Indústrias farmacêuticas, de cosméticos, ou clínicas especializadas investem dinheiro e esforços para engordar as pessoas na mesma proporção do investimento para emagrecer? A publicidade investe no “engordamento” das mulheres com o objetivo de ficarem mais bonitas?
É razoável que a resposta para todas as perguntas do parágrafo anterior seja negativa.[1] E mais razoável seria repensar a desconstrução de discursos direcionados a uma promoção de insatisfação da mulher pelo seu próprio corpo, endossando imaginários sociodiscursivos que padronizam esse corpo – como se verificou nos conteúdos analisados. Faz-se necessário distinguir a aceitação dos corpos femininos gordos de sua romantização. Se a obesidade é catalogada como uma enfermidade hoje, e deve ser tratada como tal, urge a necessidade, também, de olhar com mais cuidado para a promoção de saúde física e, principalmente, mental, de sorte a legitimar a diversidade para além de interesses patriarcais e mercadológicos. E, talvez, não haja ferramenta mais poderosa do que a linguagem para tal promoção de bem-estar.
Informações Complementares
Conflito de Interesse
A autora não tem conflitos de interesses a declarar.
Declaração de Disponibilidade de Dados
Os dados, códigos e materiais que suportam os resultados deste estudo estão disponíveis como ‘arquivos suplementares’ no site da revista Cadernos de Linguística.
Declaração de Uso de IA
A autora declara que nenhuma ferramenta de IA foi utilizada na criação deste manuscrito nem em qualquer aspecto dos trabalhos realizados cujo resultado está reportado no manuscrito.
Referências
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CHARAUDEAU, Patrick. Os estereótipos, muito bem. Os imaginários, ainda melhor. Traduzido por André Luiz Silva e Rafael Magalhães Angrisano. Entrepalavras, Fortaleza, v. 7, p. 571-591, jan./jun. 2017.
CHARAUDEAU, Patrick. Linguagem e discurso: modos de organização. São Paulo: Contexto, 2008.
CHARAUDEAU, Patrick. Uma análise semiolinguística do discurso. In: PAULIUKONIS, Maria Aparecida Lino; GAVAZZI, Sigrid (Orgs.). Da língua ao discurso: reflexões para o ensino. Rio de Janeiro: Lucena, 2005.
COUTINE, Jean-Jacques. Decifrar o corpo: pensar com Foucault. Petrópolis: Vozes, [2013], 2021, p.12.
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JIMENEZ, Malu. Lute como uma gorda. São Paulo: Jandaíra, 2022.
LÉVY, Pierre. O que é o virtual? 2. ed. Tradução de Paulo Neves. São Paulo: Editora 34, 2011.
LÉVY, Pierre. Inteligência coletiva: para uma antropologia do ciberespaço. São Paulo: Loyola, 2015.
LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. 2ª ed. Tradução de Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Editora 34, 2010.
PIETROFORTE, Antonio Vicente; LOPES, Ivã Carlos; FIORIN, José Luiz. A semântica lexical. In: FIORIN, J.L. (org.). Introdução à linguística II: princípios de análise. São Paulo: Contexto, 2016.
PINTO, Danilo Corrêa. Corpos femininos produzidos pelo discurso da mídia para os desfiles de escolas de samba do carnaval carioca. In: HASHIGUTI, Simone Tiemi;
TAGATA, William Mineo (orgs.). Corpos, imagens e discursos híbridos. Campinas: Pontes Editores, 2016, p. 59-76.
SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de. História da beleza no Brasil. São Paulo: Contexto, 2014.
VIGARELLO, Georges. As metamorfoses do gordo: história da obesidade. Petrópolis: Vozes, 2012.
WOLF, Naomi. O mito da beleza: como as imagens de beleza são usadas contra as mulheres. Trad. Valdéa Barcellos – 7ª ed. – Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2019.
Avaliação
DOI: https://doi.org/10.25189/2675-4916.2025.V6.N5.ID859.R
Decisão Editorial
EDITOR 1: Tiago de Aguiar Rodrigues
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5120-0908
AFILIAÇÃO: Universidade Federal da Paraíba, Paraíba, Brasil.
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EDITOR 2: Dermeval da Hora Oliveira
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9303-5664
AFILIAÇÃO: Universidade Federal da Paraíba, Paraíba, Brasil.
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EDITOR 3: Jan Edson Rodrigues Leite
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9054-0673
AFILIAÇÃO: Universidade Federal da Paraíba, Paraíba, Brasil.
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EDITOR 4: Alvaro Magalhães Pereira da Silva
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1980-9750
AFILIAÇÃO: Instituto Federal de Sergipe, Sergipe, Brasil.
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EDITOR 5: Erivaldo Pereira do Nascimento
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4595-1550
AFILIAÇÃO: Universidade Federal da Paraíba, Paraíba, Brasil
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CARTA DE DECISÃO: A pesquisa de vocês foi reconhecida por sua relevância e potencial de impacto, especialmente por evidenciar como certas escolhas lexicais podem apagar o corpo feminino gordo das mídias sociais, um tema de grande interesse para diversas áreas, como a Teoria Semiolinguística do Discurso, as ciências da informação e a área médica. O principal ponto forte do trabalho é o contraponto que ele oferece, deslocando a discussão da "romantização da obesidade" para a "romantização da magreza" e o apagamento do corpo gordo.
Rodadas de Avaliação
AVALIADOR: Fabiana Ferreira Nascimento de Souza
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3285-1419
AFILIAÇÃO: Instituto Federal de Sergipe, Sergipe, Brasil.
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AVALIADOR: Amanda Batista Braga
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6026-5017
AFILIAÇÃO: Universidade Federal da Paraíba, Paraíba, Brasil.
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RODADA 1
AVALIADOR 1
2025-06-17 | 06:11 PM
O artigo ROMANTIZAÇÃO DA OBESIDADE? ESCOLHAS LEXICAIS EM REFERÊNCIA AO CORPO FEMININO GORDO possui um potencial impacto para os que estão dentro e fora da Teoria Semiolinguística do Discurso, pois evidencia, a partir dos seus pressupostos teóricos, como as escolhas lexicais fazem parte da construção de discursos que objetivam produzir um apagamento do corpo feminino gordo das mídias sociais. Esse achado na pesquisa da autora é importante também para a sociedade por produzir mais uma leitura possível dos discursos que insistem em colocar o aparecimento do corpo gordo feminino nas mídias como romantização da obesidade. Essa leitura que produz um deslocamento do discurso do lugar de romântico para aquele que insiste em apagar qualquer vestígio da obesidade feminina nas mídias é o ponto forte, devidamente demonstrado, do artigo.
A autora do referido artigo tem como objetivos analisar escolhas lexicais que fazem referências ao corpo feminino gordo, além de buscar refletir sobre um discurso que atribui a determinados sujeitos a romantização da obesidade. Esses objetivos foram alcançados em sua completude, no entanto entendo que a clareza sobre o segundo objetivo poderia ter ficado mais evidente no decorrer do texto. A partir da interrogação feita no título do texto, por exemplo, cria-se uma expectativa de que um discurso que teoricamente romantize a obesidade vai aparecer como corpus de análise. O que não ocorre. Fica claro, porém, no final do texto, o intuito analítico em relação à escolha da sequência discursiva analisada. As reflexões que surgem a partir da apresentação das escolhas lexicais na discursivização do corpo gordo surpreendem ao provocar o leitor a perceber como os discursos produzidos sobre a romantização da obesidade na verdade servem como o que busca apagar a mulher obesa e os discursos que mostram que seus corpos podem sim ser vistos e não varridos das diversas mídias sociais, eis o grande potencial impacto que esse texto pode produzir.
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AVALIADOR 2
2025-08-19 | 05:10 PM
O artigo discute uma questão de imensa difusão social: a circulação de imagens e dizeres sobre o corpo gordo. Existiria mesmo uma romantização da obesidade nas redes sociais? A autora, a partir de uma sólida discussão, demonstrará que não! Trata-se de uma discussão de interesse não apenas das ciências da linguagem, mas também das ciências da informação e mesmo das ciências médicas.
O artigo parte da Teoria Semiolinguística do Discurso, bem como de pressupostos da Semântica Lexical para analisar escolhas lexicais que referenciam o corpo gordo feminino em postagens de plataformas digitais. O intuito é o de refletir sobre o discurso de romantização da obesidade, em cujo cerne reside a ideia de que haveria uma mudança de atitude e de pensamento naquilo que diz respeito ao corpo gordo, que deixaria de ter um sentido disfórico para assumir um sentido eufórico.De modo geral, trata-se de um texto organizado, consistente e muito bem escrito. Seu ponto forte é, sem dúvida, a discussão teórica e, mais ainda, a discussão temática. A apresentação teórica é concisa e didática, cumprindo bem o seu propósito ao apresentar noções essenciais da Teoria Semiolinguística do Discurso: o processo de semiotização do mundo, o fazer discursivo e os imaginários sociodiscursivos. A discussão temática sobre o corpo, um pouco mais ampla, discute o corpo como ente simbólico e produtor de sentidos variáveis. É assim que a autora, sem perder de vista a dimensão história dos discursos, problematiza o modo como a concepção a respeito do corpo feminino mudou e, por conseguinte, os termos utilizados para falar sobre ele e lhe determinar valor – positivo ou negativo. Para demonstrar materialidades do discurso que se propõe a analisar, a autor apresenta, primeiramente, um quadro elaborado com base nos resultados de uma pesquisa em desenvolvimento. Nele, pode-se visualizar o modo como a linguagem é utilizada para sinalizar e atribuir sentidos (que vão do elogio ao insulto) aos corpos gordos por meio de diversos termos. Na sequência, a pesquisadora apresenta, ainda, anúncio de um plano de emagrecimento vendido pela influenciadora digital Maíra Cardi: o “Seca 360”. É ao analisar este enunciado que a autora mostra como, de fato, a sociedade continua a legitimar e valorizar os corpos que se encaixam no padrão magro. Encaminhando-se para a conclusão, a pesquisadora defende que não existe uma romantização da obesidade, mas da magreza. Por um lado, afirma, é evidente a visibilidade conquistada pelas mulheres gordas, que têm ocupado espaços nos quais não circulavam anteriormente, inclusive o espaço das redes digitais. Por outro lado, entretanto, essa visibilidade, por si só, não constituiria uma romantização da obesidade, uma vez que o conteúdo produzido por essas mulheres não propõe o corpo gordo como modelo a ser imitado e, mais do que isso, como modelo a ser perseguido e desejado. A conclusão é coerente com a análise realizada, mas representa também o pronto fraco do artigo. Isto porque a ideia de que não existiria uma romantização da obesidade não resta totalmente demonstrada, uma vez que não se apresenta e nem se analisa nenhum enunciado em que o corpo gordo esteja materializado, o que poderia oferecer um excelente contraponto com o enunciado produzido por Maíra Cardi.Ainda assim, pelo exposto, pode-se dizer que o artigo resulta de pesquisa verticalizada, apoiada em fundamentos teóricos e metodológicos coerentes com os objetivos elencados, razão pela qual consideramos que ele pode representar uma contribuição ao campo dos estudos do discurso, particularmente àquele que se dedica à análise do corpo como materialidade discursiva.
Resposta dos Autores
DOI: https://doi.org/10.25189/2675-4916.2025.V6.N5.ID859.A
RODADA 1
2025-09-04
Prezadas pareceristas,
Primeiramente, agradeço a revisão cuidadosa do texto, que me permitiu ver as lacunas presentes nele e me deu a oportunidade de saná-las.
Informo que as alterações sugeridas foram acatadas, a saber:
· Foi feita a revisão gramatical e ortográfica;
· Foi indicada referência a estudos anteriores ao artigo, que compõem a pesquisa em andamento;
· Foi acrescentada mais uma porção discursiva – um anúncio publicitário – para análise;
· Foram corrigidas e adicionadas as informações referentes aos conteúdos digitais analisados, para acesso pelo leitor.
Atenciosamente,
Giselle Maria Sarti Leal.